Ação de Bento XVI fica marcada pela «renovação» da doutrina da Igreja no «diálogo com as diferenças», considera presidente do Centro Nacional de Cultura
O presidente do Centro Nacional de Cultura, Guilherme d'Oliveira Martins, considera que a ação de Bento XVI, que hoje anunciou a resignação, «fica assinalado pelo contributo inestimável para a renovação do magistério doutrinal da Igreja num sentido ecuménico e de diálogo com as diferenças».
Em depoimento enviado ao Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, o responsável sublinha que as encíclicas "Deus Caritas Est" (2005), "Spe Salvi" (2007) e "Caritas in Veritate" (2009) «são três documentos profundamente interpelantes que ultrapassam em muito a circunstância em que surgem».
O depoimento, na íntegra:
«Estamos diante de um gesto de humildade, cujo alcance não pode ser analisado à luz de considerações de curto prazo. É, de facto, difícil fazer comentários até pelo inesperado da notícia. Personalidade multifacetada e complexa, com qualidades excecionais no plano intelectual, o Sumo Pontífice tem tido uma vida marcada pela procura exigente de caminhos de renovação, com fidelidade à Mensagem de Cristo e ao Evangelho. Contudo, não é tempo de balanço, até pelo caráter inédito desta atitude, que não se compara a qualquer outra anterior. As razões são claras e a decisão abre perspetivas novas. É tempo de lembrar o que deve ser ouvido: «O vento sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que nasceu do Espírito» (Jo. 3,8).
O pontificado de Bento XVI fica assinalado pelo contributo inestimável para a renovação do magistério doutrinal da Igreja num sentido ecuménico e de diálogo com as diferenças, em especial através de três Encíclicas muito marcantes. De facto, «Deus Caritas Est» (2005), «Spe Salvi» (2007) e «Caritas in Veritate» (2009) são três documentos profundamente interpelantes que ultrapassam em muito a circunstância em que surgem. Pela sua natureza e conteúdo constituem base para uma reflexão aprofundada no mundo contemporâneo. Se as duas primeiras se dirigem primacialmente à Igreja, sobre os temas do Amor e da Esperança, a terceira visa todas as pessoas de boa vontade (na linha de «Pacem in Terris», da constituição «Gaudium et Spes» e de «Populorum Progressio»), tratando do tema momentoso do desenvolvimento humano integral na caridade e na verdade. Não tenho dúvidas de que o tempo virá a reforçar a importância destes documentos – pelas potencialidades que apresentam. Lembro ainda, no que respeita à criação cultural e à liberdade do Espírito, a mensagem proferida a 12 de maio de 2010 no Centro Cultural de Belém na visita apostólica do Papa a Portugal, que constitui um marco inesquecível. Em 2005 tive oportunidade de saudar a eleição de Bento XVI como algo que nos iria surpreender, pelo percurso pessoal, designadamente no Concílio. A minha expectativa não foi iludida».
Guilherme d'Oliveira Martins
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11.02.13
Bento XVI com cardeal-patriarca
de Lisboa, Guilherme d'Oliveira
Martins e padre José Tolentino
Mendonça. Lisboa, 12.5.2010
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