Tenho profundo respeito pela Justiça, pelas vítimas dos crimes e pela dor dos seus familiares. Todavia, ainda antes de realizar o meu serviço de capelão na prisão, tinha dúvidas sobre a sua efetiva utilidade. Porque a prisão perpétua não favorece o caminho de recuperação, de reparação, de reconciliação e de reinserção social de quem cometeu crimes graves. (…)
Um detido confiou-me: «Não sou um santo. Aos meus filhos digo sempre que errei. Um dia, um dos dois, tinha 15 anos, foi encontrado pela mãe com um “charro”. Então confiei-lhe, pela primeira vez, porque não o sabia, que estava a cumprir prisão perpétua. Expliquei-lhe que também eu tinha começado com pequenos delitos. Ele pôs-se a chorar e abraçou-me. Se fui um bom pai, é porque não escondi as minhas responsabilidades».
Depois acrescentou: «Se nunca penso em suicídio? Todas as noites e todas as manhãs. Na minha condição… Quem se mata aqui dentro é porque ama tanto a vida, que não suporta vê-la murchar».
A prisão perpétua é, com efeito, um “medicamento” tão forte, que mata tanto o pecado como o pecador. Ou melhor, mais o pecador que o pecado. A perpetuidade da pena, o estar destinada a nunca acabar, muda radicalmente a condição existencial do detido, a sua relação consigo próprio e com os outros, a sua perceção do mundo, a sua representação do futuro. Como tal, a prisão perpétua não é comparável com a reclusão temporária, assim como não o é a pena de morte. É uma outra pena, precisamente, “capital”.
Tem-se chegado ao ponto de pensar e brincar com o facto de que morrer antes do tempo é um ganho e um “despeito” para o Estado, porque é atroz continuar a viver e a sofrer sem esperança e sem medida. Pode estar-se na prisão toda uma vida, mas não decerto com o pensamento de lá ficar toda a vida.
«A prisão perpétua não é a solução dos problemas; repito: a prisão perpétua não é a solução dos problemas, mas um problema a resolver. Porque se se enclausura na cela a esperança, não há futuro para a sociedade. Nunca privar do direito de recomeçar», declarou o papa Francisco em setembro de 2019.
Quatro anos antes, foi mais expressivo: «Falando claramente, a prisão perpétua é quase uma pena de morte oculta. Foi o que disse publicamente num discurso aos juristas europeus. Tu está ali, a morrer todos os dias, sem a esperança da libertação».
O «problema», apontou Francisco em 2019, numa das várias intervenções do seu pontificado em que se opôs à prisão perpétua, inclusive na encíclica “Fratelli tutti”, «é que a condenação deve ser sempre para a reinserção; uma condenação sem “janelas” de horizonte não é humana».