«Jesus é a Porta. Por ela, Deus vem até nós. A Igreja é a Porta: sempre aberta a todos. Mas a todos, sem excluir ninguém. Em Jesus e na Igreja, também sou Porta, sempre aberta para dar entrada a quem procura Jesus.»
«O Senhor ungiu-me para anunciar um mundo novo aos pobres. Descobrir o pobre, acudir ao pobre, comungar o pobre – eis a essência da Pastoral.»
Estas são duas das dezenas de meditações de D. Manuel Martins (1927-2017), primeiro bispo de Setúbal e figura incontornável da Igreja e da sociedade em Portugal, incluídas no livro “Partilhar é bom”, publicado pela Paulinas Editora e que chegará nos próximos dias às livrarias.
«Há muitos anos que, logo pela primeira manhã no meu encontro com Deus através da liturgia, procuro descobrir o grande apelo para esse dia, fazendo dele a luz do meu caminhar, do meu que fazer», escreveu o prelado a abrir a introdução da obra.
E prossegue: «Agora – nem eu descubro razões a sério – passou-me pela cabeça que podia ajudar alguém, pelo menos a fazer o mesmo, publicando tais pensamentos, um pouco à sorte, como à sorte me foram sugeridos por Deus. Se não fizer o bem que penso, a consciência não me acusará de nada».
O bispo D. Carlos Moreira Azevedo, que assina o prefácio, destaca que «a capacidade» de D. Manuel Martins «para aplicar as Escrituras aos problemas do momento, sem mediações ou interpretações, fica bem patente nas frases breves» recolhidas no livro.
«A face profética de D. Manuel atravessava a sua conversão e adesão pessoal a Cristo, antes de propor a crentes e não crentes uma revolucionária ternura. Estas provocações matinais orientavam a mansidão do seu coração e norteavam a defesa determinada da dignidade humana e a lucidez perante esquemas que oprimem e não
libertam sejam povos sejam pessoas», acentua.
«Tantas vidas brilharam em dignidade e serviço porque redesenhadas e guiadas pela simplicidade serena de um seguidor de Jesus, como foi o autor destas interrogações», assinala o delegado do Conselho Pontifício da Cultura, que sucedeu a D. Manuel Martins na presidência da Fundação Spes, constituída pelo bispo D. António Ferreira Gomes.
O livro, de que oferecemos seguidamente alguns excertos, vai ser apresentado na capela de Santo António, em Setúbal, este domingo, 20 de janeiro, dia em que D. Manuel Martins completaria 92 anos, às 18h00, pelo atual bispo diocesano, D. José Ornelas.
D. Manuel Martins
In “Partilhar é bom”
«A primeira e insubstituível evangelização faz-se pelas obras. Terá sido sempre assim comigo? Será que em todo o lado “cheiro” a Jesus?»
«Nos momentos difíceis – são tantos! – levanta os olhos a Jesus Crucificado. Não deixa ninguém sem auxílio. Jesus é sempre a Porta da Misericórdia, inteiramente aberta para todos. Para mim.»
«Sinto-me sempre terreno onde Deus semeia abundantemente. Que dor não dar o fruto que Ele espera! Tantos Filhos Pródigos? (Eu?). Que eu lhes abra caminho para que as festas sejam muitas.»
«Com quem gosto eu de estar mais – com Maria ou com Marta? – Quando estiver com uma, que nunca me esqueça da outra.»
«Quero hoje comer em tua casa. Não ouves que bato à porta?» – Abre. As lágrimas que Jesus chorará por mim, só por demorar em abrir. Acontecerá por vezes e por minha culpa que aquilo que o Senhor tem para me dizer não seja de agradável sabor…»
«Faço tanto que não devo. Deixo de fazer tanto que devia. Só n’Ele e com Ele, meuAdvogado, e bem agarrado a Ele, posso encontrar compreensão, ajuda, perdão.»
«“Ao Deus desconhecido.” Eu creio que o Senhor faz parte da vida de cada um. Às vezes muito escondido, às vezes substituído. Mas está. O mundo enche-nos de provas. Que O desperte em mim. Que eu O desperte nos outros.»
«O mundo está cheio de chagas. Não posso esquecer que, através dessas chagas, encontro o Senhor. “Meu Senhor e meu Deus!”»
«Senhor, como passa depressa a nossa vida! Que eu seja capaz de pôr cada dia nas Vossas mãos e não me esqueça de que a sorte deste ou daquele pode estar nas minhas mãos. Ponho-me inteiramente à Vossa disposição. Mas a sério, Senhor!»
«Não faltam p’raí falsos cristos que entusiasmam e perdem a tantos. Que eu cumpra bem o meu ministério, para que, dentro em breve possa ouvir o Senhor: “Servo bom e fiel, entra na alegria do teu Senhor.”»
«O mundo não Vos quer. Vive como se não precisasse de Vós. Que hei-de fazer, Senhor? – Ide, sem nada, só comigo e anunciai o Evangelho. Anunciai paz.»
«Que beleza extraordinária acompanhará o Encontro Final! Que nesse momento augusto brilhe para mim, para os meus, para todos aqueles a quem foi dada – para todos a luz esplêndida do Deus que é luz: “Eu sou a Luz”.»