Prémio de Cultura Árvore da Vida - Padre Manuel Antunes
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Nuno Teotónio Pereira: vida e obra

A vida de Nuno Teotónio Pereira, nascido em Lisboa no dia 30 de janeiro de 1922, marcou de modo inquestionável toda a segunda metade do século XX português, a ponto de nenhuma história de Portugal desse período poder ficar completa sem frequentes referências à sua pessoa, que desde cedo revelou uma natural atenção pelos outros, materializando-a em iniciativas que procuravam mudar para melhor o mundo que o rodeava.

Foi com esse desejo em mente que, em 1944, ainda estudante na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, elaborou, com o seu colega Manuel Costa Martins, a primeira tradução para português da famosa Carta de Atenas, manifesto do Movimento Moderno escrito por Le Corbusier, havia mais de 10 anos, e que procurava resolver os problemas da vida urbana na cidade tradicional. Quatro anos depois, a mesma dupla não se escondeu atrás da pouca idade e interviu ativamente no 1º Congresso Nacional de Arquitetura, apresentando a comunicação Habitação económica e reajustamento social, que começou dizendo: “É do conhecimento geral a premente necessidade de habitações – um dos mais tremendos problemas da época. Uma enorme parte da população está alojada em condições que não satisfazem as mais fundamentais exigências psicofisiológicas do Homem”. Este tema, onde trabalhou continuamente entre 1948 e 1972 enquanto consultor na Federação das Caixas de Previdência, foi uma das suas maiores paixões, pois permitiu-lhe colocar o seu saber profissional ao serviço dos mais necessitados.

FotoIgreja de Nossa Senhora de Fátima, Águas

A arquitetura, para Nuno Teotónio Pereira, tinha a capacidade de qualificar a vida dos homens, mas para que tal acontecesse, teria de ser autêntica em termos construtivos e verdadeiramente funcional, e não falsa, mascarada, de moda ou de compromisso, como refere ao jornal Ler, em 1953, ano em que fundou, juntamente com João de Almeida e outros colegas arquitetos e estudantes de arquitetura, o MRAR – Movimento de Renovação da Arte Religiosa. Seis anos mais tarde dirá que “a ideia de formação do MRAR não nasceu: impôs-se-nos. Teve de ser.” Porque a realidade da arquitetura religiosa era particularmente gravosa, por ter “especialíssimas exigências de verdade, harmonia e dignidade”, pelo que a prática e aceitação da mentira construtiva no edifício capital da arquitetura cristã era uma trágica contradição, que deveria ser condenada por todos os cristãos. Condenação que o grupo “pré-MRAR” fez na Exposição de Arquitetura Religiosa Contemporânea de 1953, porque “Quando se verifica, na maior parte das igrejas mais recentes, ter sido esquecido o espírito do Evangelho, (…) impõe-se uma ação de esclarecimento e uma revisão de conceitos, para que a arquitetura possa mostrar ao mundo de hoje a verdadeira face da Igreja de Cristo”. Foi esta atitude que Nuno Teotónio Pereira colocou em todos os seus edifícios, e em particular nas igrejas e mosteiros que desenhou, em espírito de Pureza, Verdade, Pobreza e Paz.

FotoIgreja de Nossa Senhora de Fátima, Águas

A igreja de Nossa Senhora de Fátima, na localidade de Águas, concelho de Penamacor, que projetou a partir de 1949, é o retrato de alguém que estava verdadeiramente atento à realidade e às necessidades humanas, e como tal, antecipou a evolução da arquitetura moderna da sua fase racionalista para uma nova, de base humana mais ampla, aberta largamente aos valores espirituais e às tradições locais, redescobertas pelo famoso Inquérito à Arquitetura Regional Portuguesa, promovido alguns anos mais tarde - entre 1955 e 1960 -, pelo Sindicato Nacional dos Arquitetos, e no qual Nuno Teotónio Pereira participou, integrando a equipa da Estremadura, Ribatejo e Beira Litoral. Sobre a sua igreja, disse o autor em 1959 que revelava inexperiência e falta de unidade, mas que a crítica real só seria feita passados mais alguns anos. Mais de 50 anos depois, a crítica não tem dúvidas de que a igreja das Águas – como é conhecida -, é um dos edifícios religiosos mais importantes da história da arquitetura portuguesa do século XX.

FotoIgreja de Nossa Senhora de Fátima, Águas

Tal como a igreja do Sagrado Coração de Jesus, em Lisboa, fruto do concurso de anteprojetos promovido pelo MRAR em 1961, e duma intensa colaboração com o arquiteto Nuno Portas. Desde cedo que esta obra se assumiu como a materialização de uma nova conceção de Igreja, menos “sociedade perfeita” e mais Igreja de serviço, ao lado dos mais pobres e necessitados, aberta ao mundo e às pessoas, caminho que seria confirmado pelo Concílio Vaticano II (1962-65).

Foto
Igreja de Santiago, Almada

Tratou-se da criação de um novo paradigma para a arquitetura religiosa, caracterizado por uma nova relação da igreja-edifício com a cidade, que era reflexo da relação que a Igreja-Ecclesia queria ter com o mundo: a igreja-edifício já não era o templo-monumento, símbolo de poder, que se impunha na cidade e à sociedade, como sucedera com as igrejas lisboetas de Santo Condestável, S. João de Deus e S. João de Brito, mas, pelo contrário, a igreja do Sagrado Coração de Jesus surgiu enquadrada no quarteirão urbano à maneira pombalina, e deu o centro do seu lote à cidade, através de uma rua que ao atravessa-lo, era um convite à vida urbana e quotidiana, sagrada e profana.

FotoIgreja de Santiago, Almada

Hoje a igreja do Sagrado Coração de Jesus é Monumento Nacional, e o mesmo valor podia ser atribuído ao mosteiro de Santa Maria do Mar (1959-1968), em Sassoeiros, concelho de Cascais, e à igreja de Santiago (1963-1971), em Almada. Na ausência da classificação oficial, esse reconhecimento é feito sempre que se recorda e se homenageia a vida e obra de Nuno Teotónio Pereira, como na grande exposição retrospetiva “Arquitetura e Cidadania” realizada no Centro Cultural de Belém, em 2004, no justo documentário “Um homem na cidade”, de Joana Cunha Ferreira, de 2009, e agora, com o Prémio Árvore da Vida, que leva também o nome do P. Manuel Antunes sj, que Nuno Teotónio Pereira bem conheceu, a ponto de saber que não seria pela amizade entre ambos que o professor jesuíta subscreveria uma afirmação sua, que ainda hoje é para nós uma lição a não esquecer: ”Depende do público cristão que a face de Cristo continue a ser odiosamente desfigurada ou se revele enfim em toda a sua pureza”.

FotoIgreja de Santiago, Almada

 

O arquiteto João Alves da Cunha, autor deste texto, está a concluir a tese de doutoramento sobre o Movimento de Renovação de Arte Religiosa, investigação que tem Nuno Teotónio Pereira como co-orientador.

 

João Alves da Cunha
Grupo de Arquitetura do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
© SNPC | 19.06.12

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Foto
Nuno Teotónio Pereira

 

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