O bispo das Forças Armadas e de Segurança considera que a Igreja devia desculpar-se e restabelecer os laços com a geração de católicos do arquiteto Nuno Teotónio Pereira, que não encontrou da generalidade da hierarquia o melhor acolhimento para a oposição à ditadura.
Há responsáveis eclesiais que «deviam pedir perdão» aos denominados católicos progressistas, afirmou D. Januário Torgal esta quarta-feira, em Lisboa, à margem da sessão de entrega do Prémio Árvore da Vida a Nuno Teotónio Pereira.
Ainda que discordassem de «aspetos ideológicos» nunca se deveriam ter «distanciado de pessoas que foram profetas, pioneiras e exemplo», e que na década de 60 marcaram «vários setores da cultura em Portugal, e fundamentalmente da cultura da Igreja», frisou.
A Igreja, sublinhou, devia ter ficado próxima dos «cristãos que se bateram contra um regime de tortura, violência e conivência escandalosa entre uma ditadura e uma Igreja da liberdade».
«Acho que devíamos sair daqui, neste cair de tarde, e perguntar se a Igreja não tem estado demasiadamente calada», disse.
«A geração que se bateu pelo restabelecimentos dos direitos humanos em Portugal, cuja maioria era católica, merecia da Igreja uma palavra que eu nunca ouvi. Acho que merecia que fizéssemos uma ponte até eles», sustentou.
D. Januário Torgal afirmou-se «convicto» de que o prémio atribuído anualmente pela Igreja Católica para distinguir a relação entre fé e cultura «significa um ato de justiça para um dos pioneiros da renovação da arte e da sua aliança com os documentos litúrgicos e a vanguarda de beleza defendida pelo Concílio Vaticano II [1962-1965]».
«Não sei se não poderei extrapolar que hoje assisti a uma aliança entre um setor da Igreja em Portugal com gente de uma época que eu considero que merecia da Igreja a reconciliação e a gratidão por aquilo que foi», afirmou.
«Porventura muitos não gostarão que eu me apodere desta sessão para dizer isto; mas eu senti que a Igreja em Portugal de alguma forma se reconciliou e dialogou com o passado, que muita gente faz por esquecer», acrescentou.
O prelado assistiu à sessão de entrega do prémio na sala de conferências da igreja do Sagrado Coração de Jesus (1970), monumento nacional de que foi Nuno Teotónio Pereira foi coautor e que, para D. Januário Torgal, oferece uma arquitetura «simples, despojada, pura, pobre e simples mas belíssima e extremamente funcional».
A cerimónia, a que assistiram cerca de 100 pessoas, contou com a presença dos bispos que compõem a Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais: D. Pio Alves (presidente), D. João Lavrador e D. Nuno Brás (vogais).