Paisagens
Paisagens
Pedras angulares A teologia visual da belezaQuem somosPastoral da Cultura em movimentoImpressão digitalVemos, ouvimos e lemosConcílio Vaticano II - 50 anosBrevesAgenda VídeosLigaçõesArquivo

Quaresma

Procissões dos Passos: a sabedoria da cruz

Ao participar na procissão dos Passos no Cartaxo, chamou-me a atenção o grande número de pessoas que seguiu esta devoção tradicional. Uma multidão numerosa estendia-se ao longo das ruas e acompanhava a procissão que se prolongou por mais de duas horas. Muito mais gente, sem dúvida, do que os participantes habituais nas eucaristias no conjunto das paróquias das redondezas. Mostravam-se atentos, silenciosos, admirados. No final, para a missa dominical, a igreja ficou repleta.

Sempre me lembro, nas procissões dos Passos, da presença de muita gente e de uma atmosfera de silêncio e de emoção: quando criança, como padre e depois como bispo. O que cativa as pessoas? Como espetáculo não é atraente. As imagens do Senhor dos Passos e da Senhora das Dores, centro da manifestação de piedade, são chocantes e desconcertantes. A música é dramática. O ambiente é solene, compenetrado, de respeito e meditação. Que tem de atraente esta devoção popular? As pessoas procuram divertimentos, distrações, e a procissão dos Passos fala de sofrimento. Que mensagem procuram e colhem nesta manifestação religiosa?

Encontrei alguma luz para esta questão na leitura de São Paulo aos Coríntios, proclamada na Missa final. Falava da sabedoria de Deus manifestada na cruz. De facto, a cerimónia no seu conjunto, com o ambiente, a decoração, as imagens, a palavra, os cânticos, proclama uma mensagem que não encontramos noutra parte: a sabedoria da cruz. Ou seja, a comunicação de que Cristo e Sua Mãe experimentaram e assumiram o nosso sofrimento por solidariedade connosco. A imagem do Senhor dos Passos é um símbolo forte do sofrimento não só de Jesus mas também do sofrimento humano. Por isso, encontra um eco profundo no coração de todos. E abre uma luz ao fundo do túnel: o caminho da cruz tem a sua realização plena na vida nova da ressurreição. A realidade chocante e difícil do sofrimento não tem a palavra final nem é inútil. Purifica, redime e conduz à vida.

Tenho a impressão de que esta mensagem é apreendida, não de modo conceptual e claro, mas pela intuição e pela emoção. Por isso me parece que o Senhor dos Passos que realça o sofrimento, infunde nos participantes esperança e coragem, pacifica e consola. “Bendito seja Deus que nos consola nas nossas aflições”, exclamava São Paulo e podemos exclamar também nós. Nos momentos dolorosos da cruz não estamos sós, perdidos, esquecidos. Cristo, Sua Mãe, os crentes e amigos acompanham-nos, sofrem connosco, amparam-nos como o cireneu, limpam-nos o rosto como a Verónica, transformam o nosso sofrimento em paz.

Esta minha leitura foi apoiada pela atenção a algumas conversões. De facto, é admirável como alguns descrentes intelectuais descobriram a verdade do cristianismo no encontro com a cruz de Cristo, como sentido e saída para a cruz do sofrimento humano. Dois exemplos muito significativos: Simone Weil e Edite Stein (hoje Santa Benedita da Cruz). Na cruz descobriram a sabedoria de Deus, a única que pode consolar e curar as dores e feridas da humanidade. Entenderam o mesmo que as pessoas simples entendem. De facto, perante o mar de sofrimento que nos esmaga, a cruz é a única esperança. “Ave crux, spes unica”.

Assim a devoção do Senhor dos Passos é um convite à esperança: “Jesus Cristo, o Bom Pastor, conhece também o vale sombrio da morte e do sofrimento porque Ele próprio o atravessou e acompanha-nos, conforta-nos e ampara-nos com a sua força e o seu cajado, na passagem difícil por esse vale que vai dar à vida nova na Sua luz e na Sua paz” (Bento XVI, SS 6).

 


A procissão dos Passos, tradição implantada em Portugal pelos Franciscanos ao longo do século XVI, é uma espécie de repetição do caminho de Jesus, desde o Pretório até ao Calvário.

Trata-se de uma reconstituição das ruas de Jerusalém, uma Via Sacra mais imponente e com forte intensidade dramática, em que o próprio Cristo caminha com os devotos que se mantém hoje como catequese viva e apelo profundo à conversão.

O Senhor dos Passos, levando a cruz às costas, atravessa as ruas, como outrora percorreu as de Jerusalém. No meio do percurso dá-se o Encontro de Jesus com a sua Mãe, a “Senhora das Dores”, um dos momentos centrais do cortejo.

Em muitos lugares, a procissão inicia-se com o Sermão do Pretório e termina com o Sermão do Calvário. O figurado processional depende das tradições locais, mas geralmente recorda passagens  evangélicas da Paixão, trechos do profeta Isaías, e as personagens que marcaram a passagem terrena do Messias. Os penitentes também estão presentes.

Igreja Viva / SNPC


 

FotoEncontro das imagem de Jesus e Maria durante a procissão dos Passos na paróquia de Cabreiros, arquidiocese de Braga, 2.3.2013. Foto: José Carlos Ferreira / Diário do Minho

 

D. Manuel Pelino
Bispo de Santarém
In Diocese de Santarém
Atualizado em 07.03.13

Procissão dos Passos
Foto: Rudi Roels













































 

Ligações e contactos

 

Artigos relacionados

 

Página anteriorTopo da página

 


 

Subscreva

 


 

 


 

 

Secções do site


 

Procurar e encontrar


 

 

Página anteriorTopo da página