D. Manuel Clemente
Um louvor à tolerância e à intervenção social
Atento, desperto para o acontecimento cultural português e do mundo, disponível para o diálogo na diversidade, mesmo se não abdica de princípios fundamentais, interveniente, apaixonado pela história, sobre a qual fala com a lucidez e a profundidade de um filósofo, eis o retrato breve de D. Manuel Clemente, bispo do Porto e Prémio Pessoa 2009, tal como é feito pelos que lhe são próximos ou à distância lhe seguem o percurso e o conjunto da obra.
Aos 61 anos, D. Manuel Clemente é o primeiro membro da Igreja Católica portuguesa a ser distinguido com o maior prémio português, no valor de 60 mil euros. A iniciativa, criada pelo Expresso há 22 anos, conta agora com o patrocínio da Caixa Geral de Depósitos.
À hora a que era feito o anúncio público da escolha do júri, o bispo do Porto iniciava uma visita pastoral à freguesia de Santa Marinha, no concelho de Vila Nova de Gaia, que se prolongou até Domingo à tarde [13 de Dezembro].
Encontrámo-lo à entrada da escola E/B 1.º Ciclo da Serra do Pilar, onde o recebeu um coro constituído por um grupo de alunos. No final de uma canção que terminava com o refrão “Tive um sonho/Sonhei a paz”, o bispo agradeceu a recepção, deu os parabéns pelo modo como todos tinham cantado e sugeriu uma alteração. É que, disse, preferia uma frase mais afirmativa: “Tive um sonho/Fiz a paz”.
Momentos antes, sempre pressionado pelo tempo e pelo desejo de não deixar que a atribulação do prémio interferisse com o curso natural de uma visita há muito programada, D. Manuel Clemente confessou-se surpreendido pela notícia que lhe fora dada na véspera [10 de Dezembro], à noite, por Francisco Pinto Balsemão, presidente do grupo Impresa, e pelo sociólogo António Barreto. Ficou tão perplexo que a princípio interpretou o contacto como apenas uma amabilidade para lhe darem conta de quem tinha sido escolhido. “Julguei que fosse outra pessoa, porque nunca me passou pela cabeça”, disse.
Reconhecido pela distinção, acha-a indevida. O prelado considera haver em Portugal “pessoas muito mais capazes de receber este prémio”. Os outros galardoados, prossegue, “são grandes figuras da sociedade portuguesa e da cultura e por isso nunca me passou pela cabeça integrar essa lista”.
Assim, ao entrar na galeria dos distinguidos com o Prémio Pessoa, sente ter de o fazer “com um sentido reforçado de responsabilidade”, a que junta crescentes obrigações “em relação à sociedade e à cultura”. Nesse sentido, o Prémio pessoa, garante o bispo do Porto, passa a ser “sobretudo uma responsabilidade e um encargo”.
Sempre ligado “à sociedade, à Igreja e à cultura numa perspectiva cristã”, que é a que o define, D. Manuel diz que se o prémio pode constituir um lampejo de felicidade, a felicidade maior “é estar com as outras pessoas” e perceber que reconhecem o quanto o bispo gosta de estar com elas “no sentido de serviço, de promoção e desenvolvimento da nossa sociedade”.
Para o biólogo Fernando Catarino, a escolha de D. Manuel Clemente “é uma agradável surpresa”. Recorda que “há uns 30 ou 40 anos, naqueles tempos em que o 25 d Abril ainda estava muito vivo”, Clemente frequentava o curso de História da Faculdade de Letras de Lisboa, “porventura um dos locais onde a agitação estudantil foi maior, mas onde terá convivido com o padre Manuel Antunes, um homem muito equilibrado, com bom senso, académico aberto”, e de quem terá bebido essas influências. Ainda assim, diz, “é um homem que dá a cara, mesmo em temas controversos”.
Mário Cláudio, também ele Prémio Pessoa, acha a escolha do júri “muito importante por se chamar a atenção para a necessidade de estabelecer uma ponte entre a Igreja e a cultura, sobretudo a cultura mais recente”. Ora, na opinião do escritor, o bispo “move-se num quadro cultural absolutamente contemporâneo e é ele mesmo produto da cultura moderna”.
Outro homem da ciência, Nuno Grande, salienta a justiça na atribuição do prémio por reconhecer em D. Manuel “um grande sentido de humanidade e atenção às marcas de cada momento, de forma a intervir nelas”.
O júri do Prémio Pessoa considerou que à tolerância, o combate à exclusão e a intervenção social são as grandes questões do momento em Portugal e, por isso mesmo, factores tidos em conta na decisão de atribuir o galardão ao bispo do Porto.
Na conferência de imprensa de anúncio do prémio, Francisco Pinto Balsemão recordou que o júri procura sempre distinguir alguém com obra feita, “mas que continua em movimento na actualidade, e que se tenha destacado no ano a que respeita”. É o caso de D. Manuel Clemente, licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa, designado bispo do Porto em 2007 e actual presidente da Comissão Episcopal de Cultura.
D. Manuel Clemente na visita pastoral a Santa Marinha, 11.12.2009. Foto: Rui Duarte Silva/Expresso
Valdemar Cruz
In Expresso, 12.12.2009
13.12.09
SNPC
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