Cinema
"Encontrarás dragões": guia histórico e cinematográfico
“Encontrarás dragões”, do realizador Roland Joffé, narra três histórias: o fundador do Opus Dei, São Josemaria Escrivá (1902-1975), e duas personagens fictícias, Manolo Torres, amigo de infância de Josemaria, e Robert, o filho que Manolo não vê há muito tempo, jornalista, que em 1982, iniciado o processo de beatificação de Escrivá, decide investigar a vida deste.
A base narrativa é bastante simples: as memórias suscitadas pela investigação jornalística de Robert obrigam Manolo a recordar o santo, lembranças essas que o transformarão para sempre, a ele e ao filho.
A narrativa decorre durante a Guerra Civil de Espanha (1936-1939), iniciada quando um grupo de generais de direita e respetivos aliados (os nacionalistas) promoveram uma rebelião contra o governo de esquerda – ou republicano –, constituído por uma coligação de liberais, socialistas, comunistas e anarquistas. A rebelião não conseguiu derrubar o governo, dando origem a uma prolongada guerra civil.
O governo republicano era um anticlerical, e havia alguns grupos – nomeadamente unidades de milicianos, que oficialmente não eram comandadas pelo regime, mas que estavam aliadas ao poder – que perseguiam violentamente a Igreja Católica; durante a guerra, foram mortos 13 bispos e milhares de padres, monges e freiras. No filme, assistimos a uma perseguição a São Josemaria, bem como ao assassínio a sangue frio de um sacerdote por um daqueles grupos.
Por seu lado, os simpatizantes nacionalistas levavam a cabo represálias e assassínios brutais; por exemplo, no filme, Manolo, instigado por um oficial do exército, mata um dirigente sindical socialista cujas greves tinham causado a morte prematura de seu pai.
No começo do filme, com uma frase carregada de ironia, Robert observa que foi à procura de um santo e acabou por encontrar um pai, porque grande parte do filme trata, em flashbacks, do longínquo passado do santo, Josemaria, e do pai, desde a infância de ambos até à Guerra Civil de Espanha, em muitos casos através das memórias gravadas por Manolo.
O centro dramático do filme não é a sua história de Escrivá; o clímax tem a ver com o momento da morte de Manolo e com o filho deste, Robert, sendo certo que Manolo é, durante grande parte do filme, uma personagem muito pouco simpática, e que Robert não passa suficiente tempo diante das câmaras para se poder dizer que transporta aos ombros o peso dramático da obra.
Os elementos mais importantes são as duas reações radicalmente diferentes (baseadas na fé e no perdão, de um lado, na duplicidade e na força, do outro) que Escrivá e Manolo manifestam em relação aos “dragões” metafóricos – uma referência à frase “hic sunt dracones” (“aqui há dragões”), com que os mapas medievais assinalavam territórios e mares ainda desconhecidos.
Os “dragões” representam no filme as dificuldades da vida, geralmente formas de maldade cujas origens podem estar na natureza (o sofrimento e a morte) ou no fundo do coração humano (a culpa).
Num enredo secundário da história de Manolo, dois amantes, Ildiko e Oriol, que combatem pelos republicanos, confrontam-se com os dragões da traição e da morte. E no auge do filme, Robert, o filho de Manolo, terá de se confrontar com o mais terrível de todos os dragões: a verdade.
“Dragões” é também uma obra sobre a busca do sentido. Manolo aposta com Josemaria que o sofrimento (e, por extensão, a própria vida) não tem objetivo; e o filme mostra não só que Manolo perde esta aposta niilista, mas também que Escrivá, armado com a fé que o primeiro não tem, integra os elementos do passado (imagens, vozes, memórias) numa visão consistente e – numa espécie de sequência onírica – compreende a vocação de fundador do Opus Dei.
John Wauck
Prelatura do Opus Dei
© SNPC |
30.05.11
"Encontrarás dragões", Josemaria Escrivá contado pelo realizador de "A Missão" | VÍDEO | | IMAGENS |