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A anunciação à Virgem Maria na religiosidade popular do interior da Beira

Introdução

As terras da Beira, de fundo matricial marcado por cultos femininos que entroncam numa época remota, transformaram-se em horizontes privilegiados da devoção mariana.

Nos séculos XI e XII, o culto à Virgem Maria, reacendido e reafirmado pelos cavaleiros templários, sobrepôs-se a antigas crenças, pontuando de ermidas e igrejas sob a invocação de Santa Maria todo o território. Se esses templos materializam, numa subtil alquimia, o sentimento religioso, por parte dos monges cavaleiros, à Mulher-Mãe, à Virgem Maria, à Mãe de Cristo, um significativo conjunto de orações e de ritualidades transmitido de boca a orelha e repetidamente praticado pelas comunidades da nossa ruralidade contemporânea testemunha, igualmente, sentires e crenças construídas no fundo do tempo.

As orações populares à Virgem Maria, naquele que é o mistério fundador do Cristianismo: a Anunciação do Anjo da Sua maternidade divina, retocadas, transformadas e adaptadas no fio do tempo pelos ventos das heresias ou por outros sentimentos religiosos, foram nas povoações da Beira, até à década de 60 do século XX, meio e veículo de expressões e de vivências muito particulares.

Analisar as expressões e as práticas deste particular segmento da piedade popular, isto é, olhá-las não apenas à luz da matriz cultural católica, mas encará-las como manifestações da inata tendência do ser humano de religação ao Sagrado, como representações distintivas da «busca de Deus na face poluída da terra», para usar palavras de Mário Martins, constituiu uma das linhas que nortearam a pesquisa para a elaboração deste livro.

Para além do trabalho de campo, reunimos e relemos algumas das recolhas do património religioso imaterial regional fixadas, durante décadas, por um diversificado conjunto de recolectores, recolhas essas que revelaram uma realidade do Sagrado que compõe uma geografia que vence os atávicos limites locais.

Em suma, pretendemos contribuir para a construção de uma cartografia das práticas do sentir e do sagrado em torno do mistério da Encarnação, emitidas a partir do espaço da Beira Interior-sul, território onde o Sagrado sempre assumiu feições particulares.

 

O relato da Anunciação na piedade popular

Uma referência da Anunciação do Anjo à Virgem Maria e do grande mistério da Encarnação surge num romance generalizado na Beira intitulado Confissão da Virgem:

Confissão da Virgem - versão de Monsanto da Beira

«Eu já vi nascer o Sóli
Lá, detrás daquela serra,
C'uma capinha vermelha
Que lh'a deu a Madalena!

Confessar-se foi a Virgem
Numa manhã d'um Domingo...
Não por ela ter pecado
Nem por tê-los cometido.
Foi só por guardar preceito
Ò seu Unigénito Filho!

- Ò Senhor padre de missa,
De confissão m' há de ouvir...
Eu venho já ocupada,
Venho em vésp'ras d'assistir...

O padre se assentou,
A donzel' ajoelhou...
O padre tanto que viu,
Pensamento duvidou!
O ventre qu'Ela levava Tod'a a Terr' alumiava!

 Ò senhor padre de missa,
Vamos a rimir pecados.
Vamos pelos mandamentos,
Que são mais velhos que a nós...

- O primeiro qu'Eu amei
Foi a Deus mais que a vós;
Não sei se farei scândula
Chamar a Jasus por Vós...

- O segundo qu'Eu jurei
Uma jura de contin'o;
Em vint’e cinco de março
Encarnei o Verbo D'vino...

- O terceiro qu'eu guardei
Os dias que festa são;
Em vint’e cinco de março
Tive grand' ocupação...

- O quinto que Eu matei
o demónio infernal;
Por conceber o Meu filho
Sem pecado original...

- O sexto qu'Eu desejei
Ter idade de minóri,
Ser esposa de Jasus
E a Mãe do Divino Sóli!

- Ó senhor padre de missa,
Stá cabada a confissão.
Pelo amor de Deus lhe peço
que me dê'te absolvição!

- Levantai-Vos, Pombinha Branca,
Meu Espelho Cristalino!
'Sp'rito Santo Vos absolva...
Eu, Senhora, não sou digno!»

 

A Confissão da Virgem - uma outra versão de Monsanto da Beira

«A Virgem se confessou, numa manhã de domingo,
No foi por ela ter pecados, nem polos ter cometido
Foi por guardar o percêto ò seu amado Filho.
-Senhor padre de missa aconfessão m 'há de d'ovir,
que me sinto pejada, vésperas de querer parir.
O padre s'assentou, A Virgem s'injoelhou.
A Virgem co sê ventre Céu e Terr'alumiou.

- Começamos pelos mandamentos, qu'e o caminho mal seguido,
- O promêro, qu'eu amei, foi a Cristo, berbem devino;
O segundo, ê guardei as cousas que de Dês são;
A vinte e cinco de março, tive grande ocupação.
O tercêro ê jurei im juramento contino;
A vinte e cinco de março incarnou o berbem devino,
O quarto, ê honrei a vosso Pai mai ca vós;
Julgo que no farei ofensa tchamar aqui a Dês por vós;
O quinto, ê matei o demónio infernal de conceber o me filho
------------------------------- sim pecado oregenél,
O sextemo sempre ê fui sempre pura e donzela,
Dia de Sã Joaquim ganhei o Céu e a Terra.
Senhor padre de missa, já stá dita a confessão,
Por caredéde vos peço que me dêteis a soblição.

- Alevantar-vos, pomba branca, me spelho crestalino,
No é bem qu'ós mês pés tchegue a mãe do berbem devino.
- Fica-te co Dês, ó padre, qu'ê vou pra Belém,
Vou ter a Jasu Cristo pra todo o noss' bem.»

 

Confissão de Nossa Senhora - Vale da Mua (concelho de Proença-a-Nova):

«Ó meu padre S. Domingos
em confissão me há de ouvir.
- Acho-me agora culpada
em vésperas de recair.
Quando o padre tal ouviu
alvorou-lhe o pensamento:
- Vamos a remir o pecado,
vamos pelo mandamento:
- O primeiro que eu amei,
foi um Divino Senhor
que eu trouxe no meu ventre
criado a Seu favor.
- O segundo é jurar,
muito jurar de contino.
A 25 de março encarnou o Deus Menino.
- O terceiro é guardar as coisas
que de Deus são;
a 25 de março foi uma grande aflição.
- O quarto é honrar
nossos pais mais que a nós.
Não sei se farei um erro,
Em chamar a Deus p'ra vós.
- O quinto é «não matar»:
eu nunca matei ninguém,
mas sempre, podendo ser,
a todo o mundo querer bem
- O sexto qu'eu sempre fui
uma casta pura donzela,
filha de S. Joaquim
ganharam o céu eterno.
- O sétimo que eu furtei
ao Pai Eterno, Seu filho
e o trouxe no meu ventre
nove meses escondido,
Lá no fim dos novos meses,
Ao vê-lo recém-nascido,
veio a chorar pelos homens
pelo pecado de ter nascido.
- Ò meu padre S. Domingos,
detalhai-me a confissão,
dai-me dela a penitência
e deitai-me a absolvição.
- Alevanta-te, ó pomba branca
ó meu espelho cristalino
eu não tenho nem que vos deite
nem que vos confessar sozinho.»

Saliente-se que a oração intitulada 'Confissão da Virgem' não é exclusiva das terras da Beira.

Em Ribeiros (Fafe), António Capão recolheu uma oração intitulada “Confissão de Nossa Senhora”, acerca da qual informa: “pode ser recitada antes da confissão”. É uma variante da “Confissão da Virgem”, rezada na Beira que termina deste modo: «Quem esta confissão disser/ E cum toda a deboçon/ Será libre do inferno/ E toda'a sua geraçon.»

Com mais semelhanças com as das aldeias da Beira é a versão recolhida no concelho de Beja. Termina deste modo:

«- Levantai-vos, pomba branca/ Me spelho cristalino/
P'r amparo de todo o bei/ Sois Mãe do Verbo devino./
- Ficai-vos com Dê's, ó Padre/ Qu'ê já me vou pr'a Blêi/ Lá vai nascer Dês Menino/ Pr'a tod'o sempr'Amen.»

Estes exemplos permitem concluir que o relato popular da Anunciação em forma de oração, intitulado Confissão da Virgem ou Confissão de Nossa Senhora, conheceu uma larga difusão em território português, muito possivelmente consequência de uma antiga forma de catequização dirigida a uma população analfabeta.

 

O ritual das comemorações populares da Anunciação nas terras da Beira

Entre as devoções populares marianas que outrora se realizavam em várias povoações da Beira, é a celebração da Anunciação e da Encarnação de Cristo a que possui um ritual com mais original expressão. Conhecida sob várias designações, a mais corrente Cem Ave Marias de Nossa Senhora de março, e a mais sugestiva Assoldadamento a Nossa Senhora de março, decorria ao longo de todo o mês de março, com o seu auge no dia 25 desse mês, dia em que a Igreja Católica comemora a Anunciação do Anjo à Virgem Maria e o mistério da Encarnação de Jesus.

 

As «Cem Ave-Marias» no Concelho de Castelo Branco

Na povoação de Escalos de Baixo, em cada um dos dias do mês de março rezavam-se trinta e uma Ave-Marias. No entanto e nesta povoação, as trinta e uma Ave-Marias eram repartidas em quatro conjuntos, englobando os três primeiros dez Ave-Marias e o quarto apenas uma.

A reza de cada conjunto era precedida por uma oração, desenro­lando-se este ritual pela forma que se segue:

1.° conjunto:

«Sagrada Virgem Maria
ConVosco me venho assoldadar;
Por todo este mês de março
Que tem 31 dias
Rezar-vos-ei 31 Ave-Marias.
(10 Ave-Marias)

2.° conjunto:

«Ó Sagrada Virgem Maria
Uma graça vos venho pedir;
Salvação para a minha alma
E graça para Vos servir.
(10 Ave-Marias)

3.° conjunto:

«Ó Sagrada Virgem Maria
Custódia da Santíssima Trindade
Dai-me bom viver, bom morrer e bom acabar
E na hora da minha morte, Senhora
Do inimigo me queirais livrar.»
(10 Ave-Marias)

4.° conjunto:

«Ó Sagrada Virgem Maria,
Já Vos deixo convidada
- A Vós e ao Vosso amado Filho -
Para que na hora da minha morte,
Senhora, estejais comigo.»
(1 Ave-Maria)

O ritual repetia-se em cada dia do mês de março, só alterado no dia 25 de março, dia da Anunciação, no qual se rezavam as Cem Ave Marias, fazendo-se então o assoldadamento do modo que se segue:

«Ó alma tem-te na fé
Jesus Cristo contigo é,
Jesus Cristo padeceu e morreu,
Tu padecerás e morrerás
Ao Vale de Josafat irás,
O inimigo encontrarás,
Tu mesmo lhe dirás:
Arreda, Arreda Satanás,
Tu na minha alma não entrarás;
Tu bem sabes e eu bem sei:
No dia da Senhora de março
Cem Ave Marias rezei
Cem vezes me persinei
Cem vezes o chão beijei
Cem vezes me empinei
E à Senhora de março as entreguei
Na hora da minha morte, senhora,
Por elas perguntarei.
Quando esta alma peregrina
Sair deste corpo para fora
Seja acompanhada dos Anjos
Até à eterna glória. Amen.»

 

As «Cem Ave-Marias» nas povoações da raia

No Ladoeiro, povoação do concelho de Idanha-a-Nova, que tem como orago Nossa Senhora da expectação, era diante do altar de Nossa Senhora do Rosário que, no dia 25 de março, se celebrava a Anunciação, rezando-se as «Cem Ave-Marias». Formando um semicírculo, frente a este altar, numa repetida melopeia, uma a uma rezavam-se as «Cem Ave-Marias». Mas um estranho rito acontecia no final de cada Ave-Maria: cada devota tomava água benta de uma malga colocada junto ao altar, em seguida beijava o chão, persignava--se e dizia: «Amém, Jesus Maria José, que é Jesus de Nazaré». No final, depois de rezadas as «Cem Ave-Marias», diziam:

«Depois de 100 vezes Ave-Maria rezar
Depois de 100 vezes Jesus, Maria e José nomear
Depois de 100 vezes o chão beijar
Depois de 100 vezes água benta tomar
Depois de 100 vezes me persignar.»

Mas para patentearem o seu reconhecimento pela Encarnação de Cristo, algumas pessoas desta povoação iam mais além na sua devoção rezando no dia da Anunciação nove rosários, o que perfazia 1.431 Ave-Marias. Não era, no entanto a 25 de março, que as ofereciam à Virgem: mas sim na madrugada do domingo de Páscoa. Nesse dia, na igreja matriz e igualmente diante do altar de Nossa Senhora do Rosário, realizava-se a oferta das 1.431 Ave Marias em honra da Encarnação de Cristo, rezadas e guardadas desde o dia 25 de março.

O oferecimento fazia-se através de um diálogo que a seguir se transcreve:

«Mãe de Deus, sois Vós, socorrei-me Vós
Ofereço-vos estas joias
Elas nove joias são,
Dadas e glorificadas!
Por minha intenção.
Queredes Vós, Senhora,
Que eu ofereça alguma
Á Sagrada morte e Paixão?»

Na Aldeia do Bispo (concelho de Penamacor) também o oferecimento das Cem 'Ave-Marias' rezadas no dia 25 de março eram oferecidas na meia-noite de sábado de Aleluia. Era a seguinte a oração da oferta:

«Alma minha tem fé em nosso Senhor Jesus Cristo.
O demónio fugirá de mim, porque no dia 25 de março 100 vezes na igreja entrei,
100 me ajoelhei, 100 me levantei,
100 me benzi, sem me persinei,
100 Ave-Marias rezei e 100 vezes o chão beijei.
A Vós Virgem me encomendo para que me livreis do demónio na hora
da minha morte, sede o meu guia. Amen.»

Relata José Manuel Landeira que, para conseguirem uma contagem correta das «Cem Ave-Marias» e dos ritos que cem vezes tinham de realizar, as devotas, sempre que entravam na igreja, metiam pequeninas pedras numa bolsa. As pedrinhas correspondiam ao número de entradas que haviam feito na igreja e às cem Ave-Marias que tinham rezado e as vezes que se tinham benzido.

Numa outra povoação do concelho de Penamacor, a aldeia de Benquerença, rezavam, em cada um dos dias do mês de março, uma Ave-Maria e no dia 25, o dia da Anunciação, nove rosários, o que perfazia 1431 Ave-Marias. No primeiro dia do mês de março recitavam a seguinte oração:

«-Convosco me assoldado,
Ò Virgem Maria;
A soldada, que vos peço,
É paz e alegria.

- Paz e alegria
Era o que eu mais queria.

Este mês de março
Tem trinta e um dia:
Por isso vos rezo
Trinta e uma Ave-Maria.»

Fernando Manteigas Robalo Eivas acrescenta mais alguns pormenores ao ritual das «Cem Ave-Marias» outrora vivenciados nesta povoação da Benquerença.

Refere este autor que os nove rosários rezados no dia 25 de março eram oferecidos à porta da Igreja Matriz antes do nascer do sol, passando os ofertantes as contas do rosário e dizendo a cada Ave Maria: «Sempre Virgem Mãe de Deus» e a cada Pai Nosso: «Virgem Mãe Santíssima, que alvíssaras dareis a quem sempre vos disse: - sempre Virgem Maria?». No dia 31 faziam o oferecimento das orações de todo o mês, através destas palavras: «As trinta e uma Ave-Marias que rezei no colo da Virgem Maria as deitei e na hora da minha morte lá as encontrarei.»

As gentes de Monsanto da Beira, com o seu curioso linguarejar, marcado pelas corruptelas que a transmissão oral confere a tudo o que a tradição vai construindo, proporcionaram a versão do seu «assoldadamento» à investigadora Maria Leonor Carvalhão Buescu, que assim a recolheu no início da década de 60:

«Oferecimento das 100 Ade-Marias

Mnh'alma tem-te firme na féi,
Jasu Cristo contigo éi,
Jasu Cristo morreu e padeceu,
Tu morrerás e padecerás,
Ò vale de Judas irás,
E c'o veneno te incontrarás,
E desta parte le derás:
- Arred'árreda, Rabarás,
Na mnh’alma no intrarás
Nem nela part’terás,
No dia vinte e cinco de março,
Cem Ade-Marias rezei,
E cem vezes me persinei,
E cem vezes o tchão beijei,
Estas cem Ade-Marias qu'ê rezei,
No regaço da Virgem Mari'às dêtei,
S'a hora da mnha morte,
As ê precesér, senhora,
Ê por elas proguntarei.

Era junto ao altar da Nossa Senhora do Rosário que, no dia 25 de março, se realizava o oferecimento.

O oferecimento obedecia a um ritual idêntico ao das outras povoações raianas, que impunha que, no final de cada uma das Avé-Maria, se beijasse o chão. Seria este antigo gesto de veneração que levaria ao agonizar e, por fim, ao desaparecimento desta forma de expressão da piedade popular em Monsanto. Foi a critica mordaz de um dos antigos párocos que, pelos anos 60, dizia que as devotas no ritual do oferecimento se assemelhavam «a galinhas que debicavam o chão em busca de alimento», para usar as palavras da informante Adriana Lopes Dionisio, que constituiu a razão que levou ao desvanecimento desta expressão de piedade popular e, atualmente, ao seu completo esquecimento.

Na povoação raiana de Penha Garcia, concelho de Idanha-a-Nova, como em muitas outras povoações, chamava-se a março - «Mês das Trinta e uma Ave-Marias».

Ao começar este mês, rezava-se diariamente a seguinte oração:
«Eu me entrego à Virgem Maria, neste mês de março que tem trinta e um dias, para lhe rezar todos os dias trinta e uma Ave Marias.»

E em seguida as trinta e uma Ave-Marias eram recitadas, terminando do seguinte modo: «Eu vos peço, ó Virgem Sagrada, que no fim da minha vida, me pagueis a minha soldada.» No dia 25 de março rezavam-se as «Cem Ave-Marias» na igreja, ou em qualquer outro lugar desde que houvesse água benta, porque, em cada Avé-Maria rezada, era preciso utilizá-la para se fazer o sinal da cruz e beijar o chão.

Após as «Cem Ave-Marias» rezadas, recitava-se a seguinte oração:

«Alma minha, põe-te firme na fé,
Jesus Cristo contigo é.
Jesus Cristo morreu e padeceu
e tu morrerás e padecerás.
Ao Vale de Jerafaz irás
e com o demónio te encontrarás.
Deste modo lhe dirás:
arreda, arreda de mim Barrabás,
tu comigo não entrarás,
nem parte da minha alma terás.
Tu que sabes e eu que sei,
no dia 25 de março 100 Ave Marias rezei,
100 vezes a água benta deitei,
100 vezes me persignei
e 100 vezes o chão beijei.
No regaço da Virgem Maria as deitei
à hora da minha morte,
se eu as precisar,
eu lhas perguntarei.»

Em Idanha-a-Nova, a devoção a «À Senhora de março» assenta igualmente no ritual do oferecimento das «100 Ave-Marias». Conta Jaime Lopes Dias: «Em Idanha-a-Nova, no dia 25 de março organizam-se grupos que se dirigem à Igreja paroquial ou a qualquer lugar onde haja um crucifixo, e, depois, de se persignarem, ajoelham-se e dizem em voz alta a seguinte oração, acompanhando cada verso, com a recitação de 10 Ave-Marias, precedidas cada uma pelo sinal da cruz:

«-Arrenego de ti, diabo
- Minha alma tem-te firme!
Sempre firme na fé de Cristo,
Padecerás e morrerás,
Ao vale de Jesophat irás,
O inimigo encontrarás,
E desta sorte lhe dirás:
Arreda-te lá Satanás,
Tu, comigo, poder não hás,
Tu bem sabes e eu bem sei!
As cem Ave-Marias que rezei
E as cem vezes que me persignei
Cem vezes as rezei,
Cem vezes te arreguei
E com elas me salvarei».

Uma outra versão, também da vila de Idanha-a-Nova, era a seguinte:
«A Nossa Senhora de março
Tem-te alma, tem-te virgem,
Tem-te alma na fé de Cristo.
Cristo por ti morreu,
Tu por Ele morrerás.
No Vale de Jurafás passarás,
O demónio encontrarás,
E tu lhe dirás:
- Arreda, arreda, Satanás,
Tu comigo não irás.
Em dia de Nossa Senhora da Encarnação
Cem Ave Marias rezei,
Cem vezes me persinei,
Cem vezes o chão beijei.
À Senhora da Encarnação as entreguei,
Na hora da minha morte lhas pedirei.
Rezam cem vezes Ave-Marias, beijam cem vezes o chão e persignam-se cem vezes.»

 

Maria Adelaide Neto Salvado
In A anunciação à Virgem Maria na religiosidade popular do interior da Beira, ed. Palimage
27.08.12

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Capa

A Anunciação à Virgem Maria na religiosidade popular
do interior da Beira

Autora
Maria Adelaide Neto Salvado

Editora
Palimage

Ano
2011

Páginas
152

Preço
11,87 €

ISBN
978-989-703-013-0

 

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