A "Nouvelle Revue Théologique", uma das mais antigas e prestigiadas revistas católicas de teologia, aplaudiu o livro "Nenhum caminho será longo - Para uma teologia da amizade" e o seu autor, José Tolentino Mendonça.
A obra, originariamente publicada em Portugal em 2012 pela Paulinas Editora, foi traduzida em 2014 para francês pelas edições Salvator, com o título "Petit traité de l'amitié".
Para François Odinet, o padre e poeta português «perscruta a experiência da amizade», nela discernindo «uma luz para a vida espiritual com sabedoria, humor e um certo júbilo».
«Os cristãos falam tanto de amor a propósito de Deus e da sua fé, que acabam por pronunciar palavras vazias de sabor. A exclusividade do vocabulário amoroso pode também deixar na sombra aspetos essenciais da experiência espiritual. Esta constatação brevemente enunciada por José Tolentino Mendonça condu-lo a propor um rico relance do que a amizade oferece à fé», assinala o autor.
No artigo, publicado na mais recente edição da revista, lê-se que Tolentino Mendonça está consciente de que o «respeito da diferença do outro faz também parte da relação amorosa. Todavia, enquanto que o amor comporta uma força unitiva mais marcada, a amizade é fundada e dinamizada por essa distância que permanece entre os amigos».
«A amizade aparece como um ritmo. É por isso que "a aplicação do paradigma da amizade à nossa relação com Deus pode ter um efeito extraordinariamente libertador". Os eclipses da nossa fé, as aridezes da oração, a necessidade do tempo e da paciência, encontram-se aqui tranquilamente situados: Deus conduz cada um a encontrar o ritmo próprio à sua vida espiritual», considera Odinet.
Nesta obra de «estrutura livre e flexível», de cadência «meditativa», a amizade com Deus é um itinerário «nunca concluído», que exclui «seguir um caminho já traçado» ou «conformar-se com um modelo antecipadamente definido».
Nas «numerosas evocações da Escritura, são desenvolvidas a amizade com Deus e o seu ponto de incandescência, a relação de amizade com Cristo. De maneira mais original, José Tolentino Mendonça evoca igualmente a amizade com o Espírito Santo. Nós concebemos de bom grado a sua presença sob o modo da efusão: presença e ação do Espírito em nós, intimidade que é uma experiência de plenitude. A distância, porém, não é abolida: não podemos nem presumir os seus dons, nem ignorar os instantes onde não sentimos a sua presença».
O núcleo da obra consiste na convicção de que «a amizade permite a aceitação da imperfeição e da fragilidade». «O amigo afasta-nos da procura narcísica da perfeição: na amizade que se dá "como uma história ainda por fazer", a imperfeição oferece-nos poder sempre "começar e recomeçar"». Desta forma torna-se mais evidente que «se Deus se faz nosso amigo, não é por causa das nossas qualidades reais ou potenciais, mas porque Ele nos quer a nós mesmos».
«Meditar sobre a amizade não é fazer abstração do que a fere, nem mesmo rejeitar essa dor sobre o terreno da experiência-limite. Plenas de sensibilidade, as páginas 199 a 225 consideram a dolorosa realidade da traição, que parece rasgar a amizade. Elas abrem-se na terrível questão de Jesus a Judas: "Amigo, porque estás aqui?"», refere o artigo.
A amizade «é atravessada pelas lágrimas semelhantes às de Pedro, que, também ele, trai o seu mestre, antes de fazer a experiência da amizade radical nas margens do lago da Galileia, ao ouvir Jesus dizer-lhe: "Tu és deveras meu amigo?"».
Após a leitura deste ensaio, «só se pode esperar que os escritos do seu autor sejam mais traduzidos, de maneira que a sua voz se faça ouvir no universo francófono», conclui François Odinet.
Com mais de 150 anos, a "Nouvelle Revue Théologique", é publicada trimestralmente por um grupo de professores do Instituto de Estudos Teológicos da Faculdade de Teologia da Companhia de Jesus (Jesuítas), em Bruxelas.
Rui Jorge Martins