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Sophia de Mello Breyner foi poeta da luz à procura da Luz, considera patriarca de Lisboa

«Luz surpreendente, intensa demais para olhos quaisquer, anterior ainda a quem a buscasse, interior, até, para quem não pudesse enxergá-la»: assim é a luz divina que Sophia de Mello Breyner procurou, afirmou esta quarta-feira o patriarca de Lisboa.

As palavras de D. Manuel Clemente foram proferidas na missa celebrada na Capela do Rato, na capital, durante as cerimónias de trasladação da poeta para o Panteão Nacional.

Sophia «nasceu no Porto, onde a luz é mais recolhida e íntima», e habitou em Lisboa, «onde é larga e clara», apontou o prelado, para quem «há sempre luz» na poeta que morreu a 2 de julho de 2004.

Referindo-se à leitura bíblica que abriu a Liturgia da Palavra, extraída da primeira carta de S. João, D. Manuel Clemente lembrou que «a luz absoluta é outro nome de Deus»: «Deus é luz, e nele não há nenhuma espécie de trevas», e «se caminhamos na luz, como Ele está na luz, então temos comunhão uns com os outros».

«Creio que a universal aceitação de Sofia e do que escreveu provém muitíssimo daqui, da grande luz que nos dá no rosto. da sua ambição insaciável de ser clara, mas de uma clareza final que passa por desvendamentos árduos para conseguir alvorecer, por fim», assinalou.

O patriarca mencionou depois um dos principais temas da autora, a Grécia, para estabelecer uma comparação com a história bíblica e o cristianismo, realçando que «Sophia é helénica e cristã».

«Como a filosofia dos seus amados gregos precisou de decantações de mitos e figuras para atingir a iluminação da mente que ainda temos, também o caminho bíblico que igualmente herdámos precisou de muito deserto e não menos noites para se concentrar numa figura concreta onde cabe a humanidade toda, e o seu Criador também», disse.

A homilia de D. Manuel Clemente foi pontuada por versos de Sophia, como este, de há sete décadas: «A presença dos céus não é a Tua,/ Embora o vento venha não sei donde./ Os oceanos não dizem que os criaste,/ Nem deixas o Teu rasto nos caminhos./ Só o olhar daqueles que escolheste/ Nos dá o Teu sinal entre os fantasmas».

Em 1967, escreveu Sophia, também citada pelo patriarca: «Senhor libertai-nos do jogo perigoso da transparência./ No fundo do mar da nossa alma não há corais nem búzios/ Mas sufocado sonho/ E não sabemos bem que coisa são os sonhos/ Condutores silenciosos canto surdo/ Que um dia subitamente emergem/ No grande pátio liso dos desastres».

D. Manuel Clemente aludiu igualmente a perspetivas que defendem o afastamento de Sophia da fé cristã, sublinhando que, «bem pelo contrário, dela se aproximava e bem mais por dentro».

«A noite abre os seus ângulos de luz/ E em todas as paredes te procuro/ A noite ergue as suas esquinas azuis/ E em todas as esquinas te procuro/ A noite abre as suas praças solitárias/ E em todas as solidões eu te procuro/ Ao longo do rio a noite acende as suas luzes/ Roxas verdes e azuis/ Eu te procuro»: desta vez Sophia em "O Cristo cigano".

Para D. Manuel Clemente, a «luz foi procurada» pela poeta «como quem tateia e insiste, como quem escala uma árdua vertente do lado de cá do nascer do sol, ou da face de Deus», palavras que evocaram a poesia do salmo bíblico proclamado na missa: «Esta é a geração dos que o procuram, dos que buscam a face do Deus de Jacob».

O «realismo maior que só a poesia consegue alcançar» reside igualmente no último poema de Sophia que o patriarca de Lisboa citou na homilia: «Navegavam sem o mapa que faziam/ (...) Os homens sábios tinham concluído/ Que só podia haver o já sabido:/ Para a frente era só o inavegável/ (...) Depois surgiram as costas luminosas/ Silêncios e palmares frescor ardente/ E o brilho do visível frente a frente».

«Percebermos a razão mais forte para uma missa por Sophia se converter em missão para todos. Com ela ficamos, com ela prosseguimos, e assim será», concluiu D. Manuel Clemente.

A celebração prosseguiu com a Oração dos Fiéis, com a assembleia a rezar pelas necessidades da Igreja e do mundo, tendo sido lembrada a obra e o legado da autora: «Agradecemos-te, Senhor, a vida e a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen, e pedimos-te que a transparência moral da sua poesia nos inspire na construção de um Portugal mais justo, culturalmente mais coeso e mais fraterno».

A importância dos artistas também foi lembrada nas intenções apresentadas na missa: «Agradecemos-te, Senhor, o dom da vida e a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen, e nela agradecemos o dom que representam todos os poetas, escritores e artistas, para que as suas vozes sejam escutadas e o seu papel na nossa sociedade seja compreendido e estimado».

A assembleia orou igualmente pelas pessoas que se interrogam: «Por todos os que têm sede de justiça, sentido para vida e sede de beleza, por todos os que caminham de pergunta em pergunta, por todos os que tentando ainda não conseguem, para que juntos descubramos que Deus se faz perto».

A missa foi concelebrada pelo padre José Tolentino Mendonça, responsável pela Capela do Rato e diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.

FotoMIssa na Capela do Rato, Lisboa, presidida por D. Manuel Clemente (2.7.2014)

 

Rui Jorge Martins
© SNPC | 02.07.14

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FotoSophia de Mello Breyner
Foto: D.R.

 

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