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Leitura: "Rosto social da religião"

Leitura: "Rosto social da religião"

Imagem Capa | D.R.

«Que lugar para a religião na sociedade?» é o questionamento que alicerça o novo livro "Rosto social da religião - As motivações religiosas das organizações sócio caritativas católicas", de Roberto Rosmaninho Mariz.

A investigação sonda «a presença da religião na "cidade", na sociedade, na vida cívica e pública», pressupondo que a intervenção social da Igreja católica é «fundamentada nas suas próprias crenças, o que torna a atividade social (especificamente no âmbito da organização caritativa) uma dimensão da própria religião», assinala o autor.

A obra, publicada pela Editorial Cáritas, procura «perceber onde, quando e como a religião tem legitimidade para ser presença operante na sociedade», como ela se deverá «"posicionar" no seio da sociedade» e como ambas se articulam. «Em suma, enquadrar a «cidadania» de uma determinada religião no seio de uma determinada sociedade».

«Os agentes sociais (direções e colaboradores) realizam este trabalho movidos pelo facto de serem crentes ou não? Estão convictos da importância do serviço social para a religião ou não? O mesmo se diga dos utentes/clientes. Será importante a Igreja ter este tipo de instituições? Fazem elas parte da ação da Igreja?» constituem algumas das interrogações colocadas no volume.



Ainda que a expressão da crença, «normalmente através do culto, assuma configurações comunitárias, isso parece não eliminar o seu estatuto fundamentalmente privado. E mesmo que as manifestações culturais dessa crença seja evidentes, isso não invalida que se considere a relação individual ao transcendente – nalguns contextos redefinida como “espiritualidade” – como o núcleo da experiência religiosa»



O autor considera «dois opostos: a religião interpretada como fenómeno com relevância, presença e pertinência social ou a religião interpretada como dimensão unicamente pessoal e da consciência. É na definição desta amplitude que se situa o problema: afirmar ou não a dimensão social, pública e exterior como intrínsecas ao ato de crer».

No prefácio, o diretor-adjunto da Faculdade de Teologia da Universidade Católica sublinha que «um dos conceitos mais debatidos no contexto das transformações modernas foi, sem dúvida, o conceito de religião».

A concetualização da religião, escreve João Duque, tem como tendência mais vincada «conferir estatuto “público” à política e à economia, e considerar do âmbito privado, porque simplesmente dependente de opções individuais, os campos da ética e da religião».

Ainda que a expressão da crença, «normalmente através do culto, assuma configurações comunitárias, isso parece não eliminar o seu estatuto fundamentalmente privado. E mesmo que as manifestações culturais dessa crença seja evidentes, isso não invalida que se considere a relação individual ao transcendente – nalguns contextos redefinida como “espiritualidade” – como o núcleo da experiência religiosa», aponta o investigador.

«Destas transformações resultou que se tenha passado a considerar, habitualmente, a religião – nomeadamente o cristianismo – como o conjunto de expressões da crença num ser transcendente e inefável, com pertinência individual, relativamente a uma dimensão da vida que nada tem a ver com a organização pública do quotidiano, considerada profana», refere o professor catedrático.



«A assumir-se como uma religião, o cristianismo não aceita ser relegado para um estatuto simplesmente privado ou simplesmente transcendente. Trata-se de uma interpretação da realidade a partir da sua relação com Deus – nesse sentido, numa perspetiva claramente religiosa – mas que diz respeito a todas as dimensões dessa realidade»



Todavia, «o cristianismo – nem sempre com a mesma intensidade, é certo – sempre viu com suspeita esta separação entre dimensão pública e dimensão privada da atividade humana. Por isso, até chegou a manifestar dificuldade em se aceitar a si mesmo como uma “religião”, no sentido moderno do termo. Porque a sua leitura integral exige uma conceção de ser humano como pessoa, ou seja, como sujeito, cuja diversidade de dimensões não permite a divisão do indivíduo em esferas separadas».

«A assumir-se como uma religião, o cristianismo não aceita ser relegado para um estatuto simplesmente privado ou simplesmente transcendente. Trata-se de uma interpretação da realidade a partir da sua relação com Deus – nesse sentido, numa perspetiva claramente religiosa – mas que diz respeito a todas as dimensões dessa realidade. A sua visão é pois integral e portanto fundamental», acentua João Duque.

As estruturas cristãs «sempre mantiveram vivas expressões desta integralidade da sua perspetiva, das quais sobressaem as denominadas “obras sociais”. Essas dão corpo a um espírito religioso que tem consciência de se constituir como realidade concreta, de dimensão pública e cívica, muito para além do conceito moderno de religião», aponta o coordenador do Doutoramento em Estudos da Religião da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Católica, em Braga.

Porém, prossegue o prefácio, «não é garantido que os agentes dessas expressões sociais, sejam eles institucionais ou pessoais, tenham consciência da relação entre essas iniciativas “sociais” e a “fé” que professam, considerada “especificamente” religiosa. Ou seja, pode não existir a consciência de que essas atividades são propriamente religiosas, pois isso parece contradizer o seu conceito moderno, individualizante e até mesmo psicologizante».



O livro constitui «um importante estudo para melhor compreender – numa perspetiva interna, ou seja, partindo do modo como a “religião” cristã se interpreta a si mesma – em que medida as pessoas envolvidas em inúmeras instituições do género estão cientes do seu significado religioso», e apresenta «um alerta, que pode ser útil para uma prática auto-reflexiva das instituições eclesiais»



A obra de Roberto Mariz «procura investigar indicadores que permitam – ou não – identificar essa consciência em determinadas atividades relacionadas com a Igreja católica, que a complexidade do contexto poderia colocar fora do âmbito religioso».

«Para tal, fundamenta a perspectiva cristã sobre o “religioso” na Doutrina Social da Igreja, melhor fundamento documental para a compreensão da dimensão sócio-política da fé cristã. Partindo dessa “identidade” do cristianismo e do pressuposto de que certas realizações da Igreja, como é o caso de muitas IPSSs, correspondem à articulação histórica da dimensão social da fé, procede a uma análise cuidada dos indicadores que revelem consciência institucional e pessoal desse facto», explica João Duque.

O teólogo considera que o livro constitui «um importante estudo para melhor compreender – numa perspetiva interna, ou seja, partindo do modo como a “religião” cristã se interpreta a si mesma – em que medida as pessoas envolvidas em inúmeras instituições do género estão cientes do seu significado religioso», e apresenta «um alerta, que pode ser útil para uma prática auto-reflexiva das instituições eclesiais».

Na primeira parte do volume, intitulada "Sociedade e religião", são desenvolvidos os capítulos "Cidadania do sagrado", "Religião: narrativa social", "Cristianismo: reabilitação da vítima" e "Doutrina Social da Igreja: impulso para a ação social". "Metodologia e enquadramento epistemológico", "Aferição estatutária e regulamentar" e "Pulsar da religião na sociedade" constituem os temas principais da segunda secção, "IPSS's canónicas: que rosto".



 

SNPC
Publicado em 06.03.2017

 

Título: Rosto social da religião - As motivações religiosas das organizações sócio caritativas católicas
Autor: Roberto Rosmaninho Mariz
Editora: Cáritas
Preço: 15,00 €

 

 
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