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Quando um cristão critica a Igreja, está a amá-la ou a repudiá-la?

Quando um cristão critica a Igreja, está a amá-la ou a repudiá-la?

Imagem kasto/Bigstock.com

Falar hoje da Igreja é penoso e difícil porque ela não goza de boa reputação e toda a sua apologia surge como inadmissível, não só pelos não cristãos, mas também por muitos católicos. Se o papa Bento XVI chegou ao ponto de dizer que a Igreja se tornou um dos maiores obstáculos à difusão da fé, agora são muitos - também por causa dos repetidos acontecimentos escandalosos, enfatizados pelos meios de comunicação - que a julgam como instituição distante do Evangelho. O próprio papa Francisco convoca constantemente os vários componentes da Igreja - bispos e padres incluídos - para uma maior coerência com o ensinamento evangélico e o exemplo deixado por Jesus.

Mas as advertências que chegam do sucessor de Pedro recordam-nos que para um cristão a Igreja não pode ser reduzida a uma instituição nem pode ser julgada simplesmente na sua realidade pecadora. A Igreja é e deve ser sentida pelo crente como uma mãe, porque assim Jesus a confiou ao discípulo amado sob a cruz; por seu lado a Igreja deve sentir os discípulos de Jesus como seus filhos, porque é mãe, e não madrasta dos cristãos. Ora, de uma mãe os filhos maduros sabem ler qualidades e defeitos, sabem endereçar-lhe um elogio e ler-lhe também os limites, mas sempre no amor: se um filho tem de criticar a sua mãe, deve fazê-lo reconhecendo-lhe sempre com gratidão essa inegável identidade materna.

As críticas dirigidas à Igreja podem ser muitas e todos hoje as conhecem e ouvem, mas também há razões para lhe reconhecer dons e positividade. Antes de tudo a Igreja é o ventre que gera cristãos e torna a fé possível. Sem a presença da Igreja nos séculos nenhum de nós hoje tentaria ser um discípulo de Jesus, nenhum de nós leria o Evangelho como Palavra de Deus que salva. Bastaria pensar que foi a Igreja nascida do Pentecostes a proclamar e confessar que Jesus é Senhor, a "produzir" as Escrituras do Novo Testamento, até nos dar os quatro Evangelhos.



Hoje temos cristãos que não só não amam a Igreja, como nem sequer sabem que existe: cristãos sem mãe, órfãos que até contestam quem, tendo paixão pela Igreja, ousa com amor denunciar-lhe as contradições à vontade do seu Senhor



É a Igreja que desde o início, de geração em geração, transmite mais ou menos eficazmente a fé; é a Igreja que incarna a fraternidade e a irmandade dos crentes em Cristo; é a Igreja o espaço no qual os cristãos se alimentam do Corpo de Cristo e vivem o perdão dos pecados; é a Igreja que acompanha como numa caravana os cristãos, peregrinos e viandantes em direção ao Reino. Mas, sobretudo, a Igreja é a comunidade dos pequenos, dos pobres que esperam apenas no Senhor e que procuram, com alegria e cansaço, serem conformes à vida humana do seu Senhor Jesus.

Por estas razões a Igreja é reconhecida e amada como «una, santa, católica e apostólica», apesar de estar hoje dividida em muitas Igrejas que por vezes têm dificuldade em reconhecer-se numa comunidade inegável e insubstituível: a do único Batismo. Várias vezes usei a imagem das brasas do Evangelho cobertas pelas cinzas do caminho, que têm a função de conservar o fogo. Ora, a Igreja às vezes é esta cinza que, mal é atingida pelo sopro do Espírito, deixa arder novamente o fogo. Se a Igreja é sentida assim, se o seu ícone é a Mãe de Jesus, então o cristão poderá criticá-la, corrigi-la, apelar profeticamente à sua identidade, querida para ela pelo seu Senhor e Mestre: esposa bela, pronta para a vinda do Esposo.

Hoje temos cristãos que não só não amam a Igreja, como nem sequer sabem que existe: cristãos sem mãe, órfãos que até contestam quem, tendo paixão pela Igreja, ousa com amor denunciar-lhe as contradições à vontade do seu Senhor. Não esqueço um episódio de que fui testemunha: um cardeal, de férias na montanha, encontrou o P. Michele Do, um pároco profético e santo, incómodo pela sua parresia. O prelado repreendeu-o: «Ah, tu és daqueles que não ama a Igreja e a critica!». Os olhos azuis do P. Michele iluminaram-se e, com o dedo levantado para o cardeal, respondeu: «A si, eminência, não lhe permito que fale assim. O senhor, da Igreja, só beneficiou, com a carreira eclesiástica e as honras. Nós sofremos da parte da Igreja, porque a amamos demasiado!».



Título original: «Caminhar é essencial»



 

Enzo Bianchi
In "Monastero di Bose"
Trad.: SNPC
Publicado em 09.06.2017

 

 
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