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Papa lamenta que pobres aumentem quando as 50 pessoas mais ricas podiam salvar milhões de vidas

«Queria começar com um dado factual: o mundo é rico e, no entanto, os pobres aumentam à nossa volta»: este foi o motivo condutor da intervenção que o papa dirigiu esta quarta-feira, no Vaticano, a líderes financeiros e especialistas em economia de vários pontos do globo.

Corrupção, paraísos fiscais, fuga aos impostos, lavagem de dinheiro, dívidas impagáveis, injustiça, indústria da guerra e influência desmesurada das multinacionais foram alguns dos temas abordados por Francisco, que, a par das denúncias, vincou que a «iniquidade universal» não é um determinismo irresolúvel.

O diagnóstico da miséria impressiona: «Centenas de milhões de pessoas ainda estão mergulhadas na pobreza extrema e carecem de alimentos, habitação, atenção médica, escola, eletricidade, água potável e serviços de saneamento».

«Calcula-se que aproximadamente cinco milhões de crianças menores de cinco anos morram este ano por causa da pobreza. Outros 260 milhões, de crianças, carecerão de educação devido à falta de recursos, devido às guerras e às migrações», recordou aos participantes no seminário “Novas formas de solidariedade. Para uma inclusão, integração e inovação fraternas”.



«Temos de escolher o quê e a quem dar prioridade: se propiciamos mecanismos socioeconómicos humanizantes para toda a sociedade, ou, pelo contrário, fomentamos um sistema que acaba por justificar determinadas práticas que a única coisa que conseguem é aumentar o nível de injustiça e de violência social»



A estas causas, só por si imorais num mundo de riqueza, estão na origem de mais males: «Tráfico e novas formas de escravidão, como o trabalho forçado, a prostituição e o tráfico de órgãos.»

«Estas realidades não devem ser motivo de desespero, não, mas de ação. São realidades que nos movem a que façamos algo», vincou Francisco, que mencionou «dados quase oficiais» para afirmar que as 50 pessoas mais ricas do mundo «poderiam salvar milhões de vida a cada ano».

Com efeito, prosseguiu o papa, «um mundo rico e uma economia vibrante podem e devem acabar com a pobreza», através de «dinâmicas capazes de incluir, alimentar, curar e vestir os últimos da sociedade, em vez de excluí-los».

«Temos de escolher o quê e a quem dar prioridade: se propiciamos mecanismos socioeconómicos humanizantes para toda a sociedade, ou, pelo contrário, fomentamos um sistema que acaba por justificar determinadas práticas que a única coisa que conseguem é aumentar o nível de injustiça e de violência social», apontou.

No discurso em que citou várias vezes o ensinamento social do papa S. João Paulo II, Francisco apontou o dedo às «estruturas do pecado», entre as quais os «repetidos cortes de impostos para as pessoas mais ricas», «paraísos fiscais para as receitas privadas e corporativas» e a «possibilidade de corrupção por parte de algumas das maiores empresas do mundo, não poucas vezes em sintonia com algum setor político governante».



«Assim como existe uma “co-irresponsabilidade”», também há «uma coresponsabilidade inspiradora e esperançosa para criar um clima de fraternidade»



«Anualmente, centenas de milhares de milhões de dólares, que deveriam pagar-se em impostos para financiar os cuidados médicos e a educação, acumulam-se em contas de paraísos fiscais, impedindo assim a possibilidade do desenvolvimento digno e sustentado de todos os atores sociais», notou.

Todavia, «a maior estrutura de pecado, ou a maior estrutura de injustiça, é a indústria da guerra, já que é dinheiro e tempo ao serviço da divisão e da morte», causando a cada ano perdas de «biliões de dólares em armamentos e violência, verbas que terminariam com a pobreza e o analfabetismo».

Em países sobre-endividados, as pessoas mais pobres «suportam cargas de impostos esmagadoras e cortes nos serviços sociais, à medida que os seus governos pagam dívidas contraídas insensível e insustentavelmente».

Francisco encorajou os participantes, e através deles os líderes mundiais, a desacomodarem-se neste ambiente de iniquidade: «Assim como existe uma “co-irresponsabilidade”», também há «uma coresponsabilidade inspiradora e esperançosa para criar um clima de fraternidade».



O início de 2020 pode ser aproveitado para «construir pontes, pontes que favoreçam o desenvolvimento de um olhar solidário a partir dos bancos, das finanças, dos governos e das decisões económicas»



Para o papa, «uma nova ética supõe estar-se consciente da necessidade de que todos se comprometam a trabalhar juntos para fechar os esconderijos fiscais, evitar as evasões e a lavagem de dinheiro», assim como manifestar firmeza na «importância de defender a justiça e o bem comum sobre os interesses das empresas e multinacionais mais poderosas, que acabam por asfixiar e impedir a produção local».

«Que inspirador é escutar Santo Ambrósio, que pensa com o Evangelho: “Tu [rico] não dás do que é teu ao pobre [quando fazes caridade], mas estás, antes, a entregar-lhe o que é dele. Pois, a propriedade comum dada em uso para todos, só tu é que estás a usá-la», observou.

O início de 2020 pode ser aproveitado para «construir pontes, pontes que favoreçam o desenvolvimento de um olhar solidário a partir dos bancos, das finanças, dos governos e das decisões económicas».

«Necessitamos de muitas vozes capazes de pensar, desde uma perspetiva poliédrica, as diversas dimensões de um problema global que afeta os nossos povos e as nossas democracias», assinalou.

As palavras de Francisco na iniciativa organizada pela Academia Pontifícia das Ciência Sociais terminaram com um agradecimento e um apelo: «Muito obrigado. E, por favor, vou fazer um pedido, não é um empréstimo: não se esqueçam de rezar por mim, porque este trabalho que me cabe fazer não é nada fácil».


 

Rui Jorge Martins
Fonte: Sala de Imprensa da Santa Sé
Imagem: /Bigstock.com
Publicado em 06.02.2020

 

 
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