O papa escolheu uma imagem do fotógrafo norte-americano Joseph Roger O’Donnell, obtida após o bombardeamento atómico dos EUA à cidade japonesa de Nagasaki, em 1945, para denunciar «o fruto da guerra».
A imagem, feita imprimir por Francisco num cartão distribuído nos últimos dias, retrata uma criança que espera a sua vez no crematório para o irmão morto, que traz ligado a si atrás das costas. «A tristeza da criança só exprime-se no seu gesto de morder os lábios que transpiram sangue», lê-se no verso do postal. Antes do texto, a assinatura do papa e quatro palavras: «…il frutto della guerra», «…o fruto da guerra».
A fotografia e o texto evocam as palavras do papa na mensagem “Urbi et orbi” (à cidade [de Roma] e ao mundo] proferida por Francisco no dia de Natal, no Vaticano: «Hoje, enquanto sopram no mundo ventos de guerra e um modelo de progresso já ultrapassado continua a produzir degradação humana, social e ambiental, o Natal lembra-nos o sinal do Menino convidando-nos a reconhecê-lo no rosto das crianças, especialmente daquelas para as quais, como sucedeu a Jesus, “não há lugar na hospedaria”, afirmou então.
E onde se pode encontrar hoje o Menino? «Vemos Jesus nas crianças do Médio Oriente, que continuam a sofrer pelo agravamento das tensões entre israelitas e palestinianas», «vemos Jesus no rosto das crianças sírias, ainda feridas pela guerra que ensanguentou o país», «vemos Jesus nas crianças do Iraque, ainda contuso e dividido pelas hostilidades que o afetaram nos últimos quinze anos, e nas crianças do Iémen, onde perdura um conflito em grande parte esquecido, mas com profundas implicações humanitárias sobre a população que padece a fome e a propagação de doenças».
«Vemos Jesus nas crianças da África, sobretudo nas que sofrem no Sudão do Sul, na Somália, no Burundi, na República Democrática do Congo, na República Centro-Africana e na Nigéria», «vemos Jesus nas crianças de todo o mundo, onde a paz e a segurança se encontram ameaçadas pelo perigo de tensões e novos conflitos», «vemos Jesus nas crianças que padecem, juntamente com suas famílias, as violências do conflito na Ucrânia e as suas graves repercussões humanitárias», prosseguiu Francisco.
Os exemplos da infância sofredora cruzam Oriente e Ocidente: «Vemos Jesus nas crianças, cujos pais não têm emprego, provando dificuldade em oferecer aos filhos um futuro seguro e tranquilo; e naquelas cuja infância foi roubada, obrigadas a trabalhar desde tenra idade ou alistadas como soldados por mercenários sem escrúpulos», «vemos Jesus nas inúmeras crianças constrangidas a deixar o seu país, viajando sozinhas em condições desumanas, presa fácil dos traficantes de seres humanos»; «revejo Jesus nas crianças que encontrei durante a minha última viagem a Mianmar e ao Bangladesh».
O postal recorda igualmente as palavras que o papa dirigiu aos participantes no encontro “Perspetivas para um mundo livre das armas nucleares e para um desarmamento integral», em novembro: «As armas de destruição em massa, em particular as atómicas, não geram outra coisa a não ser um enganador senso de segurança e não podem constituir a base da convivência pacífica entre os membros da família humana, que deve, ao contrário, inspirar-se numa ética de solidariedade».
E na mensagem para o próximo Dia Mundial da Paz, que se assinala esta segunda-feira, 1 de janeiro, dedicada ao tema “Migrantes e refugiados: homens e mulheres em busca de paz”, Francisco lembra as situações onde mulheres e crianças «estão mais expostas aos riscos e aos abusos que chegam até ao ponto de as tornar escravas».