Naquele tempo, levantou-se um doutor da lei (...) e perguntou a Jesus: «Quem é o meu próximo?».
Jesus, tomando a palavra, disse: «Um homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos dos salteadores. Roubaram-lhe tudo o que levava, espancaram-no e foram-se embora, deixando-o meio-morto. Por coincidência, descia pelo mesmo caminho um sacerdote; viu-o e passou adiante. Do mesmo modo, um levita que vinha por aquele lugar, viu-o e passou também adiante. Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão. Aproximou-se, ligou-lhe as feridas deitando azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. No dia seguinte, tirou duas moedas, deu-as ao estalajadeiro e disse: “Trata bem dele; e o que gastares a mais eu to pagarei quando voltar”.
Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele homem que caiu nas mãos dos salteadores?».
O doutor da lei respondeu: «O que teve compaixão dele».
Disse-lhe Jesus: «Então vai e faz o mesmo». (Do Evangelho do 15.º Domingo do Tempo Comum, 10.7.2016, Lucas 10, 25-37)
Uma parábola que não paro de escutar; uma narrativa que continuo a amar porque é geradora de humano, porque contém o rosto de Deus e a solução possível para todo o drama do homem.
Quem é o meu próximo? É a pergunta de partida. A resposta de Jesus opera um deslocamento de sentido (quem destes três se fez próximo?) modificando-lhe radicalmente o conceito: o teu próximo não é aquele que tu fazes entrar no horizonte das tuas atenções, mas próximo és tu quando assumes o cuidado de um homem: não quem tu amas, mas quando tu amas.
O verbo central da parábola, aquele que brota de cada gesto do samaritano, expressa-se com as palavras «encheu-se de compaixão». Que literalmente, no Evangelho de Lucas, indica o ser tomado até às entranhas, como uma mordida, um espasmo, uma revolta, qualquer coisa que se revolve por dentro, e que é depois a fonte de onde jorra a misericórdia divina.
Compaixão é experimentar dor pela dor do homem, a misericórdia é o curvar-se. O assumir o cuidado para lhe tratar das feridas. No Evangelho de Lucas «experimentar compaixão» é um termo técnico que indica uma ação divina com a qual Deus restitui vida a quem não a tem. Ter misericórdia é a ação humana que deriva deste “sentimento divino”. Os primeiros três gestos do bom samaritano: ver, deter-se, tocar, traçam as primeiras três ações da misericórdia.
Ver: viu e teve compaixão. Viu as feridas e deixou-se ferir pelas feridas daquele homem. O mundo é um imenso pranto, e «Deus navega num rio de lágrimas» (Turoldo), invisíveis a quem perdeu os olhos do coração, como o sacerdote e o levita. Para Jesus, ao contrário, olhar e amar eram a mesma coisa: Ele é o olhar amante de Deus.
Deter-se: interromper o próprio caminho, os próprios projetos, deixar que seja o outro a ditar a agenda, deter-se no interior da vida que geme e chama. Farei mundo por este mundo toda a vez que simplesmente suspendo a minha corrida para dizer «obrigado», para dizer «aqui estou».
Tocar: o samaritano faz-se próximo, derrama óleo e vinho, enfaixa as feridas do homem, carrega-o, transporta-o. Tocar é palavra dura par nós, convoca o corpo, mete-nos à prova. Não é espontâneo tocar o contagioso, o infetado, o chagado. Mas no Evangelho toda a vez que Jesus se comove, para e toca. Mostrando que amar não é um facto emotivo, mas um facto que precisa de mãos, de tato, é concreto, tangível.
O samaritano toma conta do homem ferido de maneira até exagerada. Mas precisamente neste excesso, neste dispêndio, no agir em perda e sem contabilizar, neste amor unilateral e incondicional, torna-se feliz e divina nova para a Terra.
Ermes Ronchi