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No fim, seremos julgados pelo amor

Na margem do lago (cf. João 21,1-19), uma das perguntas mais elevadas e exigentes de toda a Bíblia: «Pedro, tu amas-me?». É comovente a humanidade do Ressuscitado: implora amor, amor humano. Pode ascender aos céus se estiver seguro de ser amado. Não pergunta: Simão, compreendeste o meu anúncio? Está claro para ti o sentido da cruz? Diz: deixo tudo ao amor, e não a projetos de que género forem. Agora tenho de ir, e deixo-vos com uma pergunta: suscitei amor em vós? Na realidade, as perguntas de Jesus são três, diferentes de cada vez, como três etapas através das quais se aproxima passo a passo de Pedro, da sua medida, do seu frágil entusiasmo.

Primeira pergunta: «Simão, filho de João, amas-me mais do que estes?». Jesus utiliza o verbo do ágape, o verbo do amor grande, do máximo possível, do confronto vencedor sobre tudo e sobre todos.

Pedro não responde com precisão, evita quer a comparação com os outros, quer o verbo de Jesus: adota o termo humilde da amizade, “philéo”. Não ousa afirmar que ama, muito menos mais do que os outros, um véu de sombra sobre as suas palavras: certo, Senhor, Tu sabes que te quero bem, sou teu amigo!

Segunda pregunta: «Simão, filho de João, amas-me?». Já não importam as comparações com os outros, cada um tem a sua medida. Mas há amor, amor verdadeiro por mim? E Pedro responde entregando-se ainda ao nosso verbo sussurrado, o mais tranquilizador, mais humano, mais próximo, que conhecemos bem; agarra-se à amizade e diz: Senhor, eu sou teu amigo, Tu sabe-lo!

Terceira pergunta: Jesus volta a reduzir as suas exigências e aproxima-se do coração de Pedro. O Criador faz-se à imagem da criatura e emprega os nossos verbos: Simão, filho de João, queres-me bem, és meu amigo?». Pelo menos o afeto, se o amor é demasiado; pelo menos a amizade, se o amor te mete medo. «Pedro, posso ter de ti um pouco de afeto?».

Jesus demonstra o seu amor baixando de cada vez as suas expetativas, esquecendo o fulgor do ágape, colocando-se ao nível da sua criatura: o verdadeiro amor põe o tu antes do eu, põe-se aos pés do amado. Pedro sente o pranto subir-lhe à garganta: vê Deus mendicante de amor. Deus das migalhas, a quem basta tão pouco, com a sinceridade do coração.

Quando interroga Pedro, Jesus interroga-me. E a questão é o amor. Não é a perfeição que Ele procura em mim, m as a autenticidade. No anoitecer da vida, seremos julgados pelo amor (cf. João da Cruz). E quando ele se abrir para o dia sem ocaso, o Senhor, mais uma vez, apenas me perguntará: queres-me bem? E mesmo que mil vezes o tenha traído, ele mil vezes me perguntará: queres-me bem? E outra coisa não tenho que responder a não ser, mil vezes: sim, quero-te bem. E choraremos juntos de alegria.


 

Ermes Ronchi
In Avvenire
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: James Tissot
Publicado em 03.05.2019

 

 
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