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“Gosto”? O algoritmo decide

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“Gosto”? O algoritmo decide

Quando os primeiros gestores das páginas na internet começaram a lamentar-se com o Google – então recentemente lançado como projeto da universidade de Stanford – porque a classificação do motor de busca não os incluía entre os resultados mais evidenciados, os dois jovens inventores, Larry Page e Sergey Brin, defenderam-se dizendo que eles nada entravavam, não havia qualquer intervenção humana, a escolha dependia exclusivamente do trabalho do programa informático.

O preciosíssimo território da primeira página dos resultados de busca, crucial para a visibilidade e, portanto, para o negócio, de quem opera na internet, é gerido por poderosos algoritmos (o principal é o “PageRank”). Para neles entrar é preciso compreender quais são os seus mecanismos e procurar entender as suas exigências. Trabalho em que estão empenhadas miríades de sociedades e pessoas singulares, atentos a registar as mais impercetíveis mudanças de funcionamento e de lógica do Google, adequando-se o mais rapidamente possível para conseguir aparecer entre os primeiros (entre os agentes da internet diz-se que «o lugar mais seguro onde esconder um cadáver é na segunda página dos resultados do Google»). «Nenhuma intervenção humana» para os fundadores do Google equivalia a uma plena garantia de neutralidade, imparcialidade e correção. E foi assim que os algoritmos fizeram a sua entrada na internet das massas.

Hoje os algoritmos são o filtro omnipresente através do qual vemos a internet. Concebidos para resolver problemas concretos, subdividindo a solução em várias passagens de um processo, os algoritmos têm aplicações em todos os ambientes em que a informática pode dar um contributo. Mas é na internet que encontram o seu habitat ideal. Com o crescimento dos conteúdos e dos serviços da rede nasceu a necessidade de individuar instrumentos que ajudem a descobrir as informações realmente pertinentes para as diversas necessidades dos navegadores.

A palavra de ordem para compreender a transformação em curso é “personalização”, ou seja, o conjunto de técnicas e estratégias que visam dar-nos uma versão da internet cada vez mais talhada às nossas exigências. Os algoritmos são programas informáticos que procuram indícios para restituir exatamente o que se deseja, assim são definidos pela próprio Google, e confecionam com zelo e precisão uma versão da internet filtrada, da qual é cada vez mais difícil sair.

O Facebook funciona de modo semelhante. Um complexo conjunto de algoritmos determina o que pode interessar e, portanto, o que vemos no nosso mural, escolhendo entre o dilúvio de mensagens provenientes dos nossos “amigos”. Recentemente a empresa foi acusada de privilegiar os conteúdos filodemocráticos na secção “trending topics” (tópicos de tendência), e também nesse caso, para se defender, o fundador, Mark Zuckerberg invocou a neutralidade dos algoritmos. Também o Twiter seguiu a mesma prática e nestes dias igualmente o Instagram, propriedade do Facebook, confirmou, após um anúncio – muito contestado – publicado em março que dentro de alguns meses abandonará a ordem cronológica na proposta de fotografias dos personagens ou amigos que são seguidos. Na prática, em vez de ver os tweets e as imagens na ordem em que foram inseridos, podemos aceder-lhes numa sequência decidida com base no nosso comportamento anterior, na popularidade de determinado conteúdo, nas nossas interações com quem o inseriu e numerosas outras variáveis. Tudo examinado pelos algoritmos. O que significa que alguns conteúdos talvez nunca os consigamos ver.

Há algumas possibilidades de intervenção – no Twitter pode restabelecer-se a ordem cronológica, e no Facebook pode indicar-se se se deseja ver as mensagens de um amigo em primeiro lugar, mas poucos fazem uso delas. Agora, entre nós e o interminável património de conteúdos, ideias, relações que a internet torna possível, há uma camada de inimaginável complexidade, um nó de programas que cruzam as páginas que vimos, as ligações que clicámos, os “gostos” que demos e milhares de outras variáveis para decidir apresentar-nos um conteúdo mais do que um outro. Isto já o tinha intuído, em 2011, o americano Eli Parisier, autor de um livro profético, “The filter bubble – What the internet is hiding from you”, onde descrevia a evolução da internet até à criação de “bolhas” nas quais aquilo que está “lá fora” é filtrado na base das exigências e dos interesses de cada utente específico.

O psicólogo Jonathan Haidt chama-o “efeito Facebbok”, isto é, o facto de que nós «queremos passar mais tempo com pessoas que pensam como nós e menos com quem tem opiniões diferentes». Hoje a personalização torna-se ainda mais capilar: os murais das redes sociais são espaços disputados pelas inserções publicitárias que querem estar certas de colocar os seus anúncios junto de conteúdos de seguro interesse para os destinatários. E assim se procede, numa procura cada vez mais minuciosa, a analisar cada mínimo detalhe das nossas ações no interior de determinada página. Um trabalho colossal e incessante que tem o objetivo de nos confirmar nas nossas convicções e dar-nos, sempre em crescendo, produtos – de todo o género – iguais ou semelhantes àqueles que recentemente clicámos ou comprámos.

Os algoritmos – novos intermediários invisíveis que tomaram o lugar dos mediadores tradicionais – trituram dados e cruzam-os na base dos próprios critérios, só em parte conhecidos. Têm uma ética fluida, com a qual não é possível negociar, que em linhas gerais faz referência a critérios como a popularidade, a novidade, o envolvimento. Informações desagradáveis ou impopulares, ou simplesmente que colocam em crise as convicções mais difundidas, dificilmente podem encontrar espaço num ambiente deste tipo. Como explicou recentemente Zeynep Tufecki no New York Times, o propósito do Facebook é maximizar o envolvimento dos utentes da página e torna-lo apetecível para a publicidade. É muito fácil clicar na tecla “Gosto”, mas ainda não há um botão que diga “Este é um artigo difícil, mas importante”. Gostar sempre mais, quase nunca se surpreender ou espantar-se: assim se está a tornar a internet. Estamos ainda certos de querer clicar “Gosto”?

 

Stefania Garassini
In "Avvenire"
Trad.: Rui Jorge Martins
Publicado em 01.07.2016 | Atualizado em 24.04.2023

 

 
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E assim se procede, numa procura cada vez mais minuciosa, a analisar cada mínimo detalhe das nossas ações no interior de determinada página. Um trabalho colossal e incessante que tem o objetivo de nos confirmar nas nossas convicções e dar-nos, sempre em crescendo, produtos – de todo o género – iguais ou semelhantes àqueles que recentemente clicámos ou comprámos
Os algoritmos – novos intermediários invisíveis que tomaram o lugar dos mediadores tradicionais – trituram dados e cruzam-nos na base dos próprios critérios, só em parte conhecidos. Têm uma ética fluida, com a qual não é possível negociar, que em linhas gerais faz referência a critérios como a popularidade, a novidade, o envolvimento
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