O P. José Tolentino Mendonça, vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, considera que a ação do papa tem dado relevância à «dimensão social da fé», não só ao nível do discurso, «mas também na sua tradução simbólica e práxica».
Em artigo publicado no semanário "Expresso", o biblista recorda a primeira visita apostólica de Francisco, poucos meses após a eleição, à ilha italiana de Lampedusa, destino de imigrantes que atravessam o mar Mediterrâneo em condições precárias causadoras de centenas de vítimas mortais.
Tolentino Mendonça está convencido de que a palavra do papa «tem contrariado a linha que internaliza e espiritualiza a fé a ponto de esta ser vivida em total alheamento face à realidade social e política, pois o que interessa é uma salvação que respeita apenas ao além e não ao presente histórico».
O autor considera que é preciso evitar «os reducionismos que fazem parte do doloroso passivo histórico» legados pelo tema "os católicos e a política", como é o caso da «redução do cristianismo a uma espécie de messianismo político, que invade e se confunde com a prática política estrita».
Por outro lado, sublinha, é necessário impedir a «domesticação» do cristianismo «como religião do estado ou mero adereço cultural que serve unicamente para fornecer um acrítico suporte ao poder, a troco de um reconhecimento que lhe garanta existência civil».
O ensinamento de Francisco, defende Tolentino Mendonça, afasta-se de ambas as «tentações históricas e, à luz da Doutrina Social da Igreja, repropõe dois tópicos».
«Um primeiro que solicita aos cristãos, para a vida pública, não uma visão hegemónica e exclusivista, mas um espírito de abertura, de encontro e de colaboração: os cristãos tornem-se parceiros na construção do bem comum. E, neste particular, as diferenças religiosas ou entre crentes e não-crentes não devem constituir um obstáculo», assinala.
A relação dos católicos com a política deve também salientar «o valor inalienável do exercício da dimensão profética para a vida coletiva», porque ela «luta por uma qualificação ética da existência, interroga, entende as vantagens de manter o espírito crítico, exerce um poder contestador que é salutar».
A natureza e a memória da experiência cristã» pedem à experiência cristã uma «inexcusável inscrição» na dimensão profética, mesmo sabendo que as religiões não têm o seu «monopólio».
Rui Jorge Martins