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“As fotos secretas do Vaticano”: O humano em primeiro plano

“As fotos secretas do Vaticano”: O humano em primeiro plano

Imagem Capa | D.R.

Mais de trezentas fotografias “secretas” de um Vaticano ultra-secular, entre Pio IX e o seu atual sucessor, foram recolhidas num livro recentemente publicado em França (“Les photos secrètes do Vatican” - “As fotografias secretas do Vaticano”, Paris, Gründ-Plon, 234 pp., 29,50 €).

A obra foi apresentada esta sexta-feira, em Roma, na Academia de França, pelo cardeal Paul Poupard, primeiro presidente do Conselho Pontifício da Cultura, e por Jean-Marie Guénois, especialista em temas do Vaticano (vaticanista) do jornal “Fígaro”, com a presença dos autores, Caroline Pigozzi e Giovanni Maria Vian.

A arte fotográfica chegou a Roma em 1840 e o primeiro instantâneo de um papa é de Gregório XVI. A 2 de outubro de 1845 é um jesuíta italiano, Vittorio della Rovere, que retrata o pontifica em visita a Tivoli com a técnica da daguerrotipia. Todavia a imagem não se conservou, diferentemente das dezenas de milhares que retratam os seus sucessores: 13, no total, até 2017, ao longo de 172 anos.

Neste período, a fotografia difundiu-se lentamente e transformou-se depois em grande velocidade, até se tornar, graças ao “smartphone”, num instrumento de comunicação de massa usado por milhões de pessoas em todo o mundo.

Conservadas no imenso arquivo fotográfico da francesa “Paris Match”, gloriosa sobrevivente das grandes revistas internacionais ilustradas, e em alguns fundos privados, as fotografias foram selecionadas por Marc Brincourt, paginadas por Michel Maiquez e introduzidas pelo diretor, Olivier Royant.



Um livro de imagens olha-se, contempla-se. É também o que sucede aqui, mas neste caso o que emerge em cada página não é o património cultural e arquitetónico, mas o património humano. As mulheres e os homens que fazem o Vaticano



O objetivo é apresentar um Vaticano “extramuros”, graças a imagens conservadas para além das fronteiras do mais pequeno Estado do mundo, e abrir a porta de um mundo de facto desconhecido, fascinante e muito mais humano do que normalmente se pensa.

 

O choque das fotos
Jean-Marie Guénois

É cómodo, mas necessário, retomar o slogan de “Paris Match”, “Le poids des mots, le choc des photos” (“O peso das palavras, o choque das fotos”) para apresentar a obra fotográfica, dedicada ao Vaticano, de Caroline Pigozzi, grande repórter de “Paris Match”, e de Giovanni Maria Vian, diretor do “Osservatore Romano”. Contém centenas de fotos, cada uma mais sugestiva que outra, que todavia podem ser resumidas em 12 palavras-chave.

A primeira é «admiração». Um livro de imagens olha-se, contempla-se. É também o que sucede aqui, mas neste caso o que emerge em cada página não é o património cultural e arquitetónico, mas o património humano. As mulheres e os homens que fazem o Vaticano. A objetiva da máquina fotográfica não é dominada pela mole monumental da basílica de S. Pedro, mas pelo olho do fotógrafo. O homem escolhe o seu ângulo, o seu ponto de vista. Neste livro é o humano a estar em primeiro plano, é o humano a guiar. Este livro é profundamente humano.

A segunda palavra é «lição». Lição de jornalismo! Por vezes os jornalistas da imprensa escrita tendem a olhar os fotógrafos do alto. Não escrevem, efetivamente… Contudo este livro restitui ao seu mester toda a sua grandeza. A nobreza do fotógrafo está precisamente aí. Antes de tudo o seu olhar para colher o campo, depois o olho para capturar o detalhe, e daí o reflexo, quase felino, instintivo, para apertar o botão no momento certo. A técnica das máquinas fotográficas modernas não mudou nada. São caçadores, mas quanta beleza! E sobretudo quanta informação! Cada foto vale de longe os melhores artigos.



Ela, a cruz, não muda; ele, o papa, passa. Da grandeza à pequenez do homem que envelhece. Permanência do mistério cristão e passagem do tempo para os seus servidores



A terceira palavra é «incarnação». João Paulo II que torce o seu calção de banho na piscina de Castel Gandolfo; ou Pio XII, morto, quando é erguido sobre um pedestal para a veneração dos fiéis. É a demonstração da humanidade concreta destes homens que parecem inalcançáveis. Faz bem – mesmo se o capítulo dedicado à morte dos papas é trágico – ver, sem “voyeurismo”, que sob a pompa e o decoro há o homem.

A quarta palavra é «emoção». Por ter visto a famosa Sala das Lágrimas vazia, esse ambiente contíguo à Capela Sistina onde o papa, recém-eleito, se recolhe e reveste pela primeira vez a veste branca, e por a ter descoberta neste livro equipada, ou seja, pronta, com a veste branca sobre um cabide, e mais em baixo um par de sapatos, e em fundo um sofá… Em resumo, pronta para acolher o novo eleito. Compreende-se então porque é que a Igreja não é um governo político. Quem lá entra não tem escolha. Designaram-no os cardeais. E ele aceitou. Mas que peso e que mistério do poder são admiravelmente expressos por este disparo!

A quinta palavra é «majestade». Sabiam que existem duas Capelas Sistinas? Uma antes do restauro e uma após o restauro. O génio da fotografia e o da paginação projetam a magnificência desta capela – o termo é definitivamente demasiado modesto – que se crê já ter visto mas que nunca se acabará de colher, tanto parece conter toda a riqueza do mundo. Quem seria capaz, hoje, não de reproduzir, mas de criar uma obra-prima tão inspirada?

A sexta palavra é «surpresa». Ver um presidente francês, Auriol, impor em 1953 o barrete cardinalício a D. Roncalli, então núncio apostólico em Paris, ajoelhado diante do representante da república laica, é totalmente inesperado. Com efeito, impor o barrete cardinalício era um uso reservado aos países de antiga tradição cristã, ligada também aos princípios e aos reis cristãos.

A sétima palavra é «história». Há um frémito pelo fim da II Guerra Mundial vendo a alta figura do general de Gaulle entrar em S. Pedro, a 30 de Junho de 1944. O homem do apelo de 18 de junho, o oficial da grande resistência a quem a França tanto deve, inclina-se aqui diante daquele que é maior do que ele! Certamente para dar graças pela paz, mas também para implorar misericórdia perante a monstruosidade de milhões de vítimas…



Há o papa Francisco que sobe num elevador do Vaticano e ao mesmo tempo aperta o botão para o fazer partir. Tudo é dito nesta foto que parece mover-se, tanto a torna poderosa a força deste papa que está a meter em movimento toda a Igreja católica



A oitava palavra é composta por dois termos: «grandeza» e «declínio». Uma dupla página apresenta três fotos em sucessão de João Paulo II de perfil, enquanto aperta a sua famosa cruz com Cristo pendurado, em três épocas diferentes. Ela, a cruz, não muda; ele, o papa, passa. Da grandeza à pequenez do homem que envelhece. Permanência do mistério cristão e passagem do tempo para os seus servidores. Entre eles o servo dos servos, o papa.

A nona palavra é «solidão». Vê-se sempre João Paulo II, a cabeça entre as mãos, apoiado num canto do terraço que domina a Praça de S. Pedro. Está só no mundo, visivelmente esmagado pelo peso do seu papel. Que dizer então da solidão de Paulo VI, de João Paulo I, de Bento XVI… e de Francisco. Cada papa acaba por ser incompreendido, isolado, criticado. É o destino do poder, mas nesta foto cheia de grão assume uma dimensão metafísica impressionante.

A décima palavra é «força». Há o papa Francisco que sobe num elevador do Vaticano e ao mesmo tempo aperta o botão para o fazer partir. Tudo é dito nesta foto que parece mover-se, tanto a torna poderosa a força deste papa que está a meter em movimento toda a Igreja católica!

A décima primeira palavra é «jornalismo». Muito interessante é uma pequena foto a preto e branco da primeira sala de imprensa do Vaticano. Estava num local que partilhava com os bombeiros do Vaticano. Assim está porque estavam juntos quantos acendiam incêndios mediáticos e quantos estão encarregados de apagar o fogo. Depois as funções separaram-se e a imprensa teve um lugar todo para si!

A décima segunda palavra é «crítica». É sempre preciso um olhar crítico, sobretudo para a segunda edição deste livro. Veja-se, por exemplo, os quartos improvisados equipados com tendas nos Museus do Vaticano para acolher e alojar os cardeais durante o conclave. Ou as fotos da liturgia e da oração, instantâneos fora do tempo e do espaço que formam o mistério essencial do Vaticano sobre o qual tudo repousa.



 

In "L'Osservatore Romano", 26.11.2017
Trad.: SNPC
Publicado em 25.11.2017

 

 

 
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