Cinema
A vida de Pi: da Índia ao Pacífico, uma aventura entre Deus e as feras
Piscine Molitor Patel nasce em Pondicherry, a "Côte d’Azur do leste indiano" com vista para a magnífica Baía de Bengala, no seio de uma família proprietária de um pequeno jardim zoológico.
Herdeiro das múltiplas influências culturais e religiosas da região, que vão do hinduísmo ao islamismo, passando inevitavelmente pelo cristianismo, Piscine cresce até à adolescência na cidade portuária que, além da árabe e portuguesa, sempre sob domínio Pallava, teve na francesa a mais evidente influência europeia.
É desta influência que deriva o seu nome, em homenagem ao complexo olímpico parisiense Piscine Molitor, e o seu primeiro momento de afirmação identitária, ao trocar a equívoca designação por uma constante matemática e um número transcendente: Pi.
Aprendendo as primeiras leis da vida com os animais do zoo, Pi desde cedo se interroga sobre a sua identidade religiosa, retirando de cada uma das influências aquilo que lhe parece fazer sentido. À revelia de um pai agnóstico auto proclama-se cristão.
Quando a viabilidade do zoo é ameaçada e a família decide partir para o Canadá, o barco em que seguem sofre uma violenta tempestade. Em pleno Oceano Pacífico, Pi vive a mais temível e extraordinária experiência humana, entregue a Deus e ao seu discernimento, num bote onde couberam ainda uma zebra, uma hiena, um orangotango... e Richard Parker, portentoso tigre de Bengala...
Desde o anúncio de adaptação de “A Vida de Pí”, do escritor canadiano Yann Martel, ao cinema, sob direção do oscarizado Ang Lee (“O Segredo de Brokeback Mountain”, “O Tigre e o Dragão”), paira no ar a interrogação sobre a sua capacidade de transpor ou reinterpretar a maior riqueza da obra literária: as interrogações e reflexões de um rapaz na passagem à idade adulta sobre o sentido da vida e da existência. Reflexões que surgem de forma mais evidente ou subliminar na relação fabulosa de Pi com os animais e inevitavelmente nos momentos de maior tragédia e espanto, ante a experiência do desespero ou da solidão. Na ausência e na magnânima presença de Deus.
A opção de Ang Lee é claramente pela magnificência de efeitos visuais, permanentemente acompanhados por uma banda sonora digna de entusiasmante aventura. Adaptação bem protagonizada por um jovem e empenhado ator, Suraj Sharma, num contexto em que tudo parece bater certo, mas que evita a todo o custo a introspeção...
Margarida Ataíde
Grupo de Cinema do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
In Agência Ecclesia / SNPC
11.12.12