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Leitura: "A arte de se maravilhar com Francisco e Jacinta de Fátima"

Leitura: "A arte de se maravilhar com Francisco e Jacinta de Fátima"

Imagem Capa | D.R.

Mais do que conhecer, entrar em relação: este é o ponto de partida do livro "A arte de se maravilhar com Francisco e Jacinta de Fátima", em que o autor, Jean-François de Louvencourt, propõe aos leitores uma aproximação espiritual aos dois pastorinhos que serão este ano declarados santos.

Na aproximação ao centenário das aparições da Virgem Maria na Cova da Iria, e também da visita do papa Francisco, nos dias 12 e 13 de maio, a comunicação social e as editoras ampliam as notícias e sugestões de livros que vão ampliar o conhecimento do público sobre os protagonistas. Todavia, nesta obra da Paulinas Editora, com prefácio da jornalista Aura Miguel, pretende-se ir mais além.

«Para apreender realmente as diversas facetas do emaravilhamento que habita e caracteriza os dois pastorinhos que são Francisco e Jacinta, não basta assistirmos como espetadores, mesmo benévolos, aos seus atos e gestos. Há que estabelecer um verdadeiro vínculo de amizade com eles, fazendo nosso, na medida do possível, aquilo que eles experimentaram e manifestaram com tanta verdade e intensidade, vibrando com aquilo que viveram, dia após dia, com uma arte que seduz e suscita a adesão», escreve o autor na introdução.

Cada um dos 10 capítulos divide-se em três secções: «A primeira, sempre negativa, abordará algumas das dificuldades, provas ou situações angustiantes com que eles se depararam, nas quais encontraremos a grande tentação do desencanto sob as suas diversas formas. Secção crucial, pois demasiadas vezes esquecemos a que terríveis pressões os Pastorinhos foram sujeitos por todos os lados, sem terem tido praticamente ninguém que os apoiasse».



Descentrando-nos de nós próprios, o emaravilhamento permite-nos acolher tudo aquilo que nos rodeia, a começar pelas coisas mais pequenas e mais humildes, tais como as mais ínfimas maravilhas da natureza ou os mais diminutos sinais de atenção dados pelos outros



A segunda parte «considerará a mais bela maneira de ultrapassar as múltiplas adversidades da vida, maneira essencialmente construtiva e tendo sempre por eixo o emaravilhamento e as suas modalidades».

Tendo em conta que o emaravilhamento proposto pelo autor «não é candura passageira nem ingenuidade efémera, mas portador de um entusiasmo e de um dinamismo de horizontes ilimitados, a terceira secção deter-se-á sobre a espiritualidade profunda daí decorrente, tanto no imediato como a prazo mais longo e até no Além».

Não é a primeira vez que Jean-François de Louvencourt, monge cisterciense da abadia de Notre-Dame de Saint Rémy, em Rochefort, Bélgica, publica sobre Fátima: dele são também os livros "Orar 15 dias com Francisco e Jacinta de Fátima" (Paulus Editora), "O Rosário com Francisco e Jacinta" (Fundação Ajuda à Igreja que Sofre), "Francisco e Jacinta de Fátima. Duas estrelas na noite do mundo" (Gráfica de Coimbra) e o recente "Dia a dia com Francisco e Jacinta de Fátima" (Paulinas Editora).



O emaravilhamento é o melhor remédio contra as desilusões e o desânimo, a melhor arma contra a resignação e o derrotismo, o mais belo aparato contra a mais lancinante das tentações: o desencanto



Emaravilhamento: Uma arte soberana e divino-humana
Jean-François de Louvencourt
In "A arte de se maravilhar com Francisco e Jacinta de Fátima"

[O] emaravilhamento, verdadeira chave de compreensão da sua espiritualidade multidimensional e trinitária, foi descoberto muito cedo pelos Pastorinhos, em contacto com a natureza, e eles nunca deixaram de o desenvolver e de o aprofundar à medida que os acontecimentos iam tendo lugar e em contacto com as pessoas com quem eles se encontravam. Mostram-nos, assim, o caminho para que nós acedamos a ele e progridamos pela nossa vez. Os Pastorinhos convidam-nos a isso, não como mestres ou peritos habilitados a fazer parte do seu saber, mas como discípulos e testemunhas que o viveram a cada momento, através das diversas circunstâncias da sua vida, tanto das mais belas como das mais perigosas.

Esse caminho foi seguido por eles até ao fim e até, há que sublinhá-lo, com uma arte consumada, ou melhor, com uma arte soberana: termo que certamente não é excessivo, visto que eles frequentavam a escola da Soberana do Céu e da Terra. De facto, uma arte assim aprende-se: de igual modo, diz-nos o papa Francisco, assim como a oração se aprende rezando, também o emaravilhamento se aprende maravilhando-se. Maravilhando-se diante de Nossa Senhora e com Nossa Senhora, diante da criação, diante dos outros, diante das Pessoas divinas. Podemos recapitular, assim, os grandes eixos dessa arte soberana.

O emaravilhamento é, primeiro que tudo e fundamentalmente, abertura. Abertura que nos faz sair de nós mesmos, do nosso egocentrismo visceral, daquela «desmedida antropocêntrica » que o papa Francisco estigmatiza na sua Encíclica Laudato si’. Descentrando-nos de nós próprios, o emaravilhamento permite-nos acolher tudo aquilo que nos rodeia, a começar pelas coisas mais pequenas e mais humildes, tais como as mais ínfimas maravilhas da natureza ou os mais diminutos sinais de atenção dados pelos outros. Essa abertura, por ténue que seja nos seus primórdios, em breve se alarga cada vez mais, tendendo por fim a tornar-se integral ao elevar-se a uma leitura sobrenatural da criação, em particular com a Eucaristia que os Pastorinhos tanto veneravam sob o nome de Jesus escondido, e da qual o papa Francisco fala nos seguintes termos nessa mesma encíclica:

«A Eucaristia é o centro do universo, o lar transbordante de amor e de vida inesgotáveis. Unido ao Filho encarnado, presente na Eucaristia, todo o cosmo dá graças a Deus. Com efeito, a Eucaristia é, em si mesma, um ato de amor cósmico. Ela une o Céu e a Terra, abraça e penetra toda a criação».

Poder infinito do amor, que tem o poder único de tudo reunir desde aqui da terra, de reunir – invisível, mas realmente –, os habitantes do Céu e da terra à volta da Eucaristia.



Amar e maravilhar-se convocam-se e atraem-se mutuamente, numa contínua e irresistível harmonia. Quem ama apaixonadamente o outro, maravilha-se diante dele e, inversamente, quem se maravilha na presença do outro, acaba sempre por amá-lo. E, quanto mais se maravilha, mais ama. Vamos mais longe: tudo em Deus é amor, e tudo o que Ele faz só pode ser amor e suscitar o amor



Eis que tudo isto nos faz pensar no célebre fresco que Rafael pintou no início do século XVI, na sala da Assinatura, no Vaticano. Um fresco grandioso, cujo centro é o Santíssimo Sacramento. Não só o centro da Igreja da terra, mas o centro do semicírculo da abóbada celeste, com os anjos e os santos. Sendo o círculo a figura dominante do fresco, a horizontal prevalece sobre a terra, ao passo que a vertical é representada pela Trindade das Pessoas divinas. Vertical descendente que atravessa o céu e se prolonga sobre a terra unificada pela Eucaristia, visto que tudo provém da Trindade. E vertical ascendente que parte da terra, reunida à volta da Eucaristia, para se elevar, no Espírito Santo, por Cristo, até ao Pai, visto que tudo conduz à Trindade.

O emaravilhamento é, de igual modo, fonte incomparável de entusiasmo e de dinamismo, um entusiasmo sempre novo, com energias inesgotáveis, à medida daquilo que é contemplado. É esse um dos pontos primordiais, visto que o emaravilhamento é o melhor remédio contra as desilusões e o desânimo, a melhor arma contra a resignação e o derrotismo, o mais belo aparato contra a mais lancinante das tentações: o desencanto. Quem se maravilha fica tão fascinado com aquilo que contempla, que se encontra, só por isso, nos antípodas de todas as formas de desencanto, estando sempre pronto a seguir o seu caminho. Escutemos, antes, as seguintes palavras do papa João Paulo II, mais fortes do que os pessimismos mais sombrios:

«De tal assombro [emaravilhamento] poderá brotar aquele entusiasmo [...]. Os homens de hoje e de amanhã têm necessidade deste entusiasmo para enfrentar e vencer os desafios cruciais que se prefiguram no horizonte. Com tal entusiasmo, a humanidade poderá, depois de cada extravio, levantar-se de novo e retomar o seu caminho».

Quem se maravilha é sempre habitado pela esperança e sabe que a vida, apesar das contingências que se interpõem, vale sempre a pena ser vivida.



Entre Deus, enquanto Trindade, a Virgem Maria, os Pastorinhos e nós próprios há um ponto comum essencial que nos entreliga: o emaravilhamento. Ponto comum à espera de ser realizado ou em vias de realização para nós. E vivido pelos Pastorinhos de forma exemplar



Digamos ainda que o emaravilhamento é projeção de luz. Daquela luz que tem o poder de transfigurar tudo aquilo em que toca com os seus raios, que tem o poder de tornar felizes e de pacificar todos os seres, a começar pelos mais próximos. É certo que não transforma os outros e o mundo como nós gostaríamos e à velocidade que desejaríamos. Porém, como ela resplandece em primeiro lugar no nosso coração, ilumina por isso mesmo o nosso amor e a nossa oração pelos outros, bem como o nosso olhar sobre os acontecimentos e sobre o mundo. É verdade que isso são «coisas escondidas». Escondidas porque precisam de silêncio para se desenvolverem e frutificarem. Contudo, precisamente essas «coisas escondidas», como nos disse atrás o futuro Bento XVI, logo no início da sua primeira peregrinação a Fátima, são «as coisas decisivas, são a força renovadora do mundo». E se uma multidão de olhares chegasse a brilhar com essa luz transfigurante, então o mundo já estaria grandemente transformado e pacificado.

Em suma, semelhante emaravilhamento, que tem o insigne privilégio de estar ao alcance de todos e de cada um, não é apenas uma arte soberana, mas uma arte divino-humana. Uma arte divino-humana que tem a sua origem em Deus, que liga intimamente Deus ao Homem e o Homem a Deus, tal como o amor. Assim como há uma arte de amar, também há uma arte de se maravilhar. Devemos dizer que amar e maravilhar-se convocam-se e atraem-se mutuamente, numa contínua e irresistível harmonia. Quem ama apaixonadamente o outro, maravilha-se diante dele e, inversamente, quem se maravilha na presença do outro, acaba sempre por amá-lo. E, quanto mais se maravilha, mais ama. Vamos mais longe: tudo em Deus é amor, e tudo o que Ele faz só pode ser amor e suscitar o amor; de igual modo, tudo em Deus é maravilha, e tudo o que Ele faz só pode ser plenamente maravilhoso e fonte de emaravilhamento. Vamos ainda mais longe: só se conhece verdadeiramente o outro, e de modo muito especial Deus, no amor e no emaravilhamento, que são aparentados até ao ponto de estarem intrínseca e eternamente ligados em Deus, visto que o Espírito Santo é, ao mesmo tempo e de modo constitutivo, Amor e Emaravilhamento.

Entre Deus, enquanto Trindade, a Virgem Maria, os Pastorinhos e nós próprios há um ponto comum essencial que nos entreliga: o emaravilhamento. Ponto comum à espera de ser realizado ou em vias de realização para nós. E vivido pelos Pastorinhos de forma exemplar: Francisco e Jacinta estão maravilhados com Deus, e Deus está maravilhado com essas duas obras-primas de Nossa Senhora, que são os Pastorinhos. Um emaravilhamento mútuo, reflexo resplandecente do emaravilhamento trinitário.



 

Edição: SNPC
Publicado em 03.04.2017

 

Título: A arte de se maravilhar com Francisco e Jacinta de Fátima
Autor: Jean-François de Louvencourt
Editora: Paulinas
Páginas: 272
Preço: 11,70 €
ISBN: 978-989-673-562-3

 

 
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