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Representações do Protestantismo na sociedade portuguesa contemporânea

O cristianismo protestante tende, na sociedade e na historiografia portuguesas, a ser definido e consequentemente secundarizado como um grupo ultraminoritário de fraco significado no universo religioso e no espaço sociocultural português. No entanto, essa invisibilidade do protestantismo esconde um conjunto de iniciativas, projectos e personalidades com um papel determinante na realidade portuguesa, marcada desde logo pela diferenciação e pluralidade que essas comunidades cristãs não-católicas, na sua complexidade e heterogeneidade, representam.

Apesar da confessionalidade do Estado português durante a Monarquia Constitucional, verificou-se paulatinamente uma implementação de correntes de origem protestante que, no marco da liberdade religiosa da Carta Constitucional de 1826, foram desenvolvendo espaços de diversidade religiosa. Esse processo histórico desenvolveu diversas representações. Se no início o protestante era percepcionado pelo padrão dominante católico como o estrangeiro, num duplo sentido político e religioso, transformou-se progressivamente no herege e no elemento desnacionalizador, acabando posteriormente por ser integrado num sistema de tolerância e liberdade de culto que culminaria, em última instância, na construção de uma plataforma de aceitação implícita. Processo este que em grande medida acompanha a contemporaneidade do país e que torna a questão da liberdade religiosa um objecto mais amplo e mais complexo, e simultaneamente mais estimulante, do ponto de vista da análise.

Neste contexto, o período que se prolongou entre 1852 e 1911, encetado com o primeiro Código Penal português e encerrado com a Lei da Separação da Igreja do Estado, correspondeu a uma conjuntura essencial, quer porque, na sua génese determinou legislativamente aquela exclusão e inclusivamente a penalização das comunidades cristãs não-católicas, como porque, com a aplicação da Lei da Separação de 1911, se desenvolveu um processo de redefinição da sociabilidade religiosa em Portugal, com destaque para o lugar aí ocupado pelo protestantismo. A problemática da luta e estruturação do sistema de liberdade e tolerância religiosas desenvolveu-se na continuidade deste percurso mas para lá das fronteiras cronológicas do mesmo, pelo que os projectos de convergência anteriormente referidos não serão abordados neste trabalho, na medida em que se desenvolveram num período significativamente posterior.

A análise desse caminho que se percorreu desde a exclusão até a liberdade de culto é pois, simultaneamente, uma interrogação acerca do modo como se desenvolveu o processo através do qual deixou de ser legítimo excluir as comunidades protestantes, bem como a sua actividade prosélita, da dinâmica social portuguesa, e passou a ser legal o desenvolvimento de um culto evangélico, com um papel na formação de sociabilidades. Com que objectivos e através de que meios se processou esse percurso da exclusão à liberdade de culto?

A abordagem cultural deste cristianismo, designado como reformado ou evangélico, bem como a multiplicidade de formas cristãs resultantes da cissiparidade contemporânea, fazem parte do processo de secularização ocorrido na sociedade portuguesa, apelando portanto a uma análise alicerçada não apenas na acção dos protestantes em si, mas também nas representações e concepções culturais predominantes com que se rotulou essa alteridade cristã. Tal perspectiva pressupõe a possibilidade de emergência e afirmação de outras instâncias de formulação da identidade nacional. O objecto de análise proposto para esta tese resulta da combinação desses dois elementos: a actividade protestante e a recepção da mesma por parte de uma sociedade confessional, de hegemonia católica.

Este estudo baseia-se em cinco objectivos fundamentais. Em primeiro lugar, a compreensão daquilo que muda, ou daquilo que não muda, entre 1852 e 1911 no que diz respeito às circunstâncias e potencialidades de desenvolvimento e de estabilização dos grupos protestantes em Portugal. Em segundo, a identificação dos elementos que permitiram que as comunidades cristãs reformadas deixassem de ser percepcionadas como um factor de desagregação numa sociedade de cidadania e começassem a desempenhar um papel activo e efectivo na mesma. Seguidamente, a análise do modo como o protestantismo foi definido, representado e redefinido no seio de uma nação hegemonicamente católica e de um Estado confessional e das alterações que se operaram nessas representações proporcionando uma progressiva integração. Em quarto lugar, o estudo dos núcleos que, na sociedade e cultura portuguesas, facilitaram essa abertura gradual e inclusivamente apoiaram o estabelecimento de uma liberdade de culto pensada também (provavelmente não exclusivamente) para a minoria protestante. Por último, a análise da estruturação dos limites do encontro momentâneo entre a religiosidade protestante e a ideologia republicana.

 

Rita Mendonça Leite
In Representações do Protestantismo na sociedade portuguesa contemporânea, ed. Centro de Estudos de História Religiosa
20.01.10

 

 

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