Vemos, ouvimos e lemos
Projeto cultural
Pedras angulares A teologia visual da belezaQuem somosPastoral da Cultura em movimentoImpressão digitalVemos, ouvimos e lemosLigaçõesBrevesAgenda Arquivo

Leitura

Revista "Communio" reflecte sobre capitalismo, crise, mercado e ética

A edição mais recente da revista “Communio”, dedicada ao tema “Um mundo que nasce”, reflecte sobre o mercado, a economia e a ética, bem como acerca do capitalismo, microcrédito e crise económica.

A apresentação, assinada por Rui Madeira e José Patrício, sintetiza os artigos que compõem este número.

“Quando foi decidida a temática do presente número, não se haviam tornado ainda patentes os sintomas e factores da crise económico-financeira que vivemos a nível praticamente mundial. Mas pressentiam-se inquietações e dinamismos de ordem vária, em busca de formas alternativas de organização e conduta humana, não apenas nem talvez principalmente em sede económica, mas ainda no domínio ecológico e cultural. A crise manifestou-se em toda a sua força no segundo semestre de 2008 e veio revelar, súbita e claramente, várias debilidades da sociedade, levando a questionar estruturas materiais, procedimentos dos agentes sociais, em especial no seu relacionamento mútuo, e também padrões e valores, mormente espirituais, que servem de esteio à vida colectiva.

ImagemO Cobrador de Impostos (Pieter Brueghel II)

O mundo é feito de mudança, como bem o expressa a sensibilidade poética, pelo que sempre conheceremos épocas mais orgânicas ou mais críticas, para usar uma terminologia centenária. Nas primeiras, pode-se tender ao descanso dos factores de mudança, enquanto que nas segundas haverá naturalmente maior consciência ou até contestação dos equilíbrios estabelecidos, mesmo que só aparentes, e propostas duma ordem diferente.

Nestas páginas, António Martins, na esteira de Martin Buber, convida a comparar dois arquétipos da itinerância humana: o de Ulisses, mais propriamente errância do que itinerância, na liberdade da busca de si mesmo e retornando a casa, onde aliás é havido por estrangeiro; o de Abraão que, na esperança da promessa em que confia, é o peregrino do futuro, paradigma escatológico do crente. Figuras da cultura ocidental, apelam à complementaridade entre liberdade e confiança.

ImagemJesus expulsa cambistas do Templo (Luca Giordano)

Na presente situação sócio-económica, muito convirá lembrar a afirmação, atribuída a Einstein, de que a forma como se resolve um problema tem de ser diversa da forma como ele nasceu. Pois não se divisa nitidamente (ainda) em que novas bases assentará a sociedade; mas a verdade é que, mesmo sem apelar explicitamente a mudanças radicais de paradigma(s), as próprias autoridades internacionais reconhecem que as vias de saída da crise vão ser mais difíceis do que os remédios de emergência a que se lançou mão para obviar a uma segunda Grande Depressão.

Vários dos contributos recolhidos pela “Communio” entrevêem o mundo que nasce analisando as raízes e manifestações quer da já denominada Grande Recessão quer da crise ecológica e dos valores. Como já sublinhava Joseph Ratzinger a meio da década de oitenta, uma economia que vise o bem comum não pode prescindir da ética, contrariamente ao que sustenta o liberalismo e o marxismo; um sistema económico justo, politicamente exequível e socialmente aceitável depende, sim, de um sistema ético determinado e este, por seu turno, só pode sustentar-se em sólidas convicções religiosas. Ora, como observa José Manuel Pereira de Almeida, após o eclodir da crise financeira tornou-se consensual a ideia de que a ela subjazia uma crise de valores; e há-de conferir-se à crise o valor próprio de apresentar o diálogo como ferramenta para a "ética partilhada" que se faz necessária. Se a crise e a recessão económicas tiveram por causa última a perda de consciência moral e de valores, desde logo o da verdade, é por este justamente que se há-de começar a reconstruir o que moralmente foi desconstruído.

ImagemBanqueiro e mulher (Marinus van Reymerswaele)

José Patrício documenta como da parte do mais alto magistério da Igreja foi bem cedo feito o diagnóstico da crise, assim como foram apontadas soluções justas em consonância com os valores próprios da doutrina social católica. Esta é objecto da intervenção de D. Oscar R. Maradiaga, dando conta da nova ordem política que emerge e de como importa construir com a lógica do bem comum.

Segundo a análise de Luís Campos e Cunha, o sistema capitalista gerou por si mesmo uma crise que se teria verificado ainda que a não tivessem alimentado outros factores, tanto de natureza ética como, por exemplo, de ordem técnico-económica. Por sua vez, Ernst-Wolfgang Bõckenfõrde sublinha ser própria do capitalismo a consideração do homem não como pessoa na sua integralidade mas apenas com as forças motoras e as funções exigidas pelos princípios do seu sistema de acção, cujo individualismo egoísta prima sobre a solidariedade interpessoal; pelo que defende que se proceda à crítica radical do capitalismo, na tradição explícita da doutrina social católica desde S. Tomás de Aquino.

ImagemO dinheiro do tributo (Masaccio)

A desregulação e os riscos ambientais iminentes ou já em curso sedimentaram indubitavelmente há mais tempo na consciência colectiva, a ponto de ser hoje incontornável a pressão exercida a tal respeito pela sociedade civil sobre a classe política, mesmo a nível mundial. O modo como a civilização tecnocientífica se transforma numa força ontológica (des)construtora de mundos é analisado por Viriato Soromenho Marques que aponta os desafios à economia de mercado, em ordem à nossa sobrevivência, combinando fertilidade criativa e tenacidade moral. Numa reflexão teilhardiana, Maria José Melo Antunes foca o respeito não apenas pelo outro, pela humanidade, mas também pela criação, acentuando a necessidade de uma acção firme e solidária.

Na secção “Depoimentos”, inserimos o testemunho pessoal de Paul Moore, em entrevista a Elena Curti, um banqueiro que soube denunciar, ainda antes da manifestação da crise financeira, a inadequação ética das práti cas bancárias e, porque não ouvido, abandonou com sacrifício pessoal, mas em coerência com a sua fé, a função que desempenhava.

ImagemSete pecados mortais: A cobiça (Jacques de Backer)

Na área da sua experiência própria, Manuel Brandão Alves analisa o microcrédito como forma de combate à pobreza e auxílio ao empreendorismo dando "novas vidas à vida". A propósito de novos tipos de organização social, João Wengorovius Meneses sublinha o conhecimento e a inovação como alavancas do futuro. Na área da informação, Francisco Sarsfield Cabral retrata com objectividade a situação que a comunicação social atravessa, na complexidade das novas possibilidades tecnológicas instrumentais, presa dos interesses económicos e do poder político.

Na secção “Perspectivas”, o artigo de Claude Dagens aborda o diálogo entre razão e fé e a superação do fideísmo, ultrapassando o medo do trabalho da inteligência, inseparável do combate da fé que se expõe, ao inspirar a reflexão dos teólogos e o comportamento dos baptizados. Assim se ajuda a compreender que o mundo não se reduz a problemas técnicos, ao poder das biotecnologias ou à lógica de um mercado internacional sem controlo; não é só um processo evolutivo, mas um dom de Deus.”

ImagemQuentin Massys

 

Artigos e autores

Entre a liberdade e a confiança (António Martins)
Mercado, economia e ética (Card. Joseph Ratzinger)
O valor da “crise de valores” (J.M. Pereira de Almeida)
Crise, sinal dos tempos (José Patrício)
Reinventar a solidariedade (Card. Oscar R. Maradiaga)
Causas da crise (Luís Campos e Cunha)
O homem funcional. Capitalismo, propriedade, papel dos Estados (E.-W. Böckenförde)
As encruzilhadas da crise contemporânea. Por um futuro sustentável (V. Soromenho-Marques)
Uma nova terra. Em resposta à crise: a evolução da consciência (M.J. Melo Antunes)
Derradeiro risco (Elena Curti)
Com o microcrédito dar novas vidas a vida (M. Brandão Alves)
O peixe amarelo – Pistas para um mundo melhor (J.W. Meneses)
Futuro incerto para a comunicação social (F. Sarsfield Cabral)
Teologia e razão contemporâneas. As razões cristãs para fazer teologia (Claude Dagens)

 

© SNPC | 03.03.10

Capa

 

 

Artigos relacionados

 

 

Página anteriorTopo da página

 


 

Subscreva

 


 

Mais artigos

Leitura
Imagem/Vídeo
Mais vistos

 

Secções do site


 

Procurar e encontrar


 

 

Página anteriorTopo da página