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Teresa de Saldanha: «Exemplo raro de persistência de fé e obras»

Imagem Teresa de Saldanha | D.R.

Teresa de Saldanha: «Exemplo raro de persistência de fé e obras»

Neste ano, dedicado pelo papa Francisco à vida consagrada, apraz-nos recordar Teresa de Saldanha (Lisboa, 1837-1916), que, nascendo e vivendo num tempo difícil para a Igreja em Portugal, ousou desafiar as leis vigentes e fundou, na clandestinidade, uma congregação, com o objetivo de evangelizar Portugal e de proporcionar a outras jovens o seguimento de Jesus na vida religiosa.

Efetivamente, três anos antes do seu nascimento, em 1834, os conventos tinham sido fechados e os religiosos expulsos. Em Lisboa, a sua cidade natal, grassava a fome, as epidemias, a ignorância, o analfabetismo, a exploração das mulheres e crianças nos trabalhos fabris.

A sua obra nasceu no Bairro de Alfama, um dos mais pobres e populosos de Lisboa, mas foram mais de trinta os locais da capital abrangidos pela sua ação evangelizadora e de promoção. E a sua obra rapidamente se estendeu de norte a sul do país.

Os últimos patriarcas de Lisboa referiram-se a Teresa de Saldanha, reconhecendo o seu carisma, a sua santidade.

D. Manuel Cerejeira, em 1939, declarou: «Madre Teresa de Saldanha é a glória da Ordem Dominicana, em Portugal.»

D. António Ribeiro sintetizou o seu carisma profético, numa homilia de 1987: «Sendo rica, sobretudo em bens de cultura e linhagem de nascimento, não receou fazer-se pobre por amor dos pobres. Logo na juventude, dedicou-se com entusiasmo à Associação Protetora das Meninas Pobres, da Rua de Santa Marta, onde exerceu relevante atividade. E mais tarde, quando pensa fazer-se religiosa, é sempre o serviço dos pobres que a seduz. Deseja uma congregação voltada para a promoção dos mais desfavorecidos.

«Ela própria assim escreve: “Em Lisboa nada existia, nesse tempo, de comunidades religiosas dedica das à vida ativa; nem Hospitaleiras, nem Doroteias; as Irmãs de Caridade francesas tinham sido expulsas; portanto, a falta tão grande de uma congregação que se dedicasse ao serviço dos pobres e educação de crianças fez-me desejar imenso trabalhar para realizar o meu sonho, o que assim parecia nesse tempo semelhante plano, pelas dificuldades que se julgavam invencíveis"».

A história das Dominicanas de Santa Catarina de Sena diz como o sonho se realizou e as dificuldades se venceram. Desde o começo, as irmãs cuidaram dos doentes, dos diminuídos, dos marginalizados, e ofereceram educação e instrução a numerosas gerações de poucos haveres.

E, mesmo quando a fundadora decidiu abrir os seus colégios a alunas mais abastadas, fê-lo a pensar nos pobres, pressentindo, justamente, que não é possível promover os mais desfavorecidos sem converter os ricos, sem formar mulheres e homens novos, de coração aberto aos clamores da pobreza e da miséria moral e material.»

D. José da Cruz Policarpo, na Sessão de Clausura do seu Processo Diocesano, a 17 de novembro de 2001, reconheceu que «com a sua vida e virtudes, Teresa de Saldanha iluminou a sociedade e a Igreja do seu tempo, como exemplo vivo do amor de Deus e do próximo. Cremos que pode continuar a brilhar e a interceder não só nesta Igreja de Lisboa, que ela amou, mas em toda a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo de quem ela hoje é santa.»

D. Manuel Clemente conhece bem a vida desta católica de Lisboa e escreveu diversos artigos acerca dela. Citamos este pequeno testemunho, de 22 de novembro de 1999:

«É importante apresentar Teresa de Saldanha como um exemplo raro de persistência de fé e obras, de afirmação da sua vocação religiosa feminina. É de uma convicção e persistência pouco vulgares, vai para a frente, apesar de grandes resistências de muitas partes.

«A época era muito difícil para as mulheres que desejavam seguir a vida religiosa. Persistir na vocação, naquele tempo, era heroico. Considero a sua canonização muito oportuna porque é um modelo para todos os fiéis».

O seu processo de canonização decorre em Roma, e algumas cidades de Portugal e do Brasil quiseram perpetuar a sua memória, dando o seu nome a ruas, casas e instituições.

Neste Ano Jubilar, a Congregação pretende olhar com gratidão a sua vida e obra e fazer memória da sua entrada no Reino, ocorrida no dia 8 de janeiro de 1916. Quer ainda, com esta lembrança agradecida do passado, escutar o que Espírito lhe diz, hoje, e abraçar o futuro com esperança, nos diversos lugares onde a sua chama carismático-profética ilumina a sociedade: Albânia, Angola, Brasil, Moçambique, Paraguai, Portugal e Timor-Leste.

O Ano Jubilar terá início no dia 11 de janeiro de 2015, com uma celebração da Eucaristia em Lisboa, na igreja de S. Domingos, na Baixa, às 11 horas, e terminará no dia 9 de janeiro de 2016 (um dia após o centenário da morte de Teresa de Saldanha), numa grande celebração, em Fátima, inserida num encontro internacional.

Proveniente de uma família nobre, Teresa nasceu no Palácio da Anunciada, na Rua das Portas de Santo Antão, em Lisboa.

A mãe teve um papel preponderante na sua orientação, primeiro na vertente educacional proporcionando-lhe o ensino de línguas, música e arte, e na domensão religiosa, iniciando-a na prática da misericórdia através da Associação de Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos, que fundou em 1848 com o intuito de prestar socorro às famílias que viviam na pobreza.

Em 1855, com dezoito anos, ao pintar o "Ecce Homo", Teresa sentiu o primeiro apelo místico e fez voto de castidade; um ano mais tarde redigiu um escrito onde declarou claramente a sua opção de exclusividade a Deus e ao serviço dos pobres.

Dirigiu o Colégio de Santa Marta para Meninas Pobres, apoiado pelas Filhas da Caridade de S. Vicente de Paulo que se encontravam em Portugal exercendo a sua missão de atender aos pobres e desprotegidos.

Em 1859, fundou, em Lisboa, com algumas amigas, e dirigiu durante toda a sua vida a Associação Protetora das Meninas Pobres, com estatutos aprovados pela Santa Sé, a 21 de Abril de 1863. Esta associação está na origem da fundação da Congregação das Dominicanas de Santa Catarina de Sena, fundada em 1868.

Teresa dedicava-se à educação de crianças pobres e à alfabetização e promoção de raparigas operárias através de aulas externas. Em 1862, as religiosas francesas foram expulsas de Portugal e Teresa, inconformada, lutou contra esta lacuna assistencial. Foi a primeira mulher fundadora em Portugal após a extinção das ordens religiosas.

Distinguiu-se na pintura, tendo aprendido com Tomás José da Anunciação, e revelou talento para pintar paisagens, retrato ou motivos profanos, a par da preferência pela iconografia religiosa.

Faleceu com fama de santidade aos 78 anos, despojada dos seus bens, que lhe tinham sido retirados com a implantação da República.

À data da sua morte erigira  27 comunidades religiosas em Portugal (17), Brasil (6), Bélgica (1), EUA (2) e Espanha (1).

Decorre atualmente o seu processo de canonização, que abriu em Portugal no ano de 1999 e encerrou em 2001; no ano seguinte a documentação foi entregue no Vaticano.

A ação da congregação que fundou, presente hoje em Portugal, Brasil, Angola e Moçambique, incide na educação feminina e de crianças, serviço aos pobres, assistência e ensino a deficientes e invisuais, auxílio a doentes e idosos e promoção social da infância e juventude, bem como na evangelização.

Da Congregação das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena nasceram dois ramos: em 1931 a vida contemplativa (Mosteiro de Nossa Senhora da Eucaristia, Lamego) e em 1952 a Congregação de Vida Apostólica, Dominicanas de Kenosha, EUA.

A Associação Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos, sediada no Convento dos Cardaes, em Lisboa, é hoje uma instituição particular de solidariedade social que cuida de pessoas cegas e com várias deficiências.

Uma comunidade de religiosas de Santa Catarina de Sena vive neste espaço, cuidando, a tempo inteiro, das 38 senhoras com deficiência, contando com a ajuda de técnicas, auxiliares e de voluntárias externas para as diversas atividades. 

A Associação é também responsável pela administração, conservação do património e animação cultural do Convento dos Cardaes.

A congregação tem outras «casas de assistência», bem como «comunidades de inserção», «comunidades de acolhimento», creches e jardins de infância, além de se dedicar ao ensino através de estabelecimentos educativos.

Em 2012, a Editorial Cáritas lançou o livro "Teresa de Saldanha - A obra sócio-educativa", de Helena Ribeiro e Castro, que o historiador António Matos Ferreira classifica de «primeiro estudo em profundidade» sobre a religiosa e que possui «inegável atualidade e originalidade».

A «singularidade» de Teresa de Saldanha, «sobretudo conhecida como católica, proveniente do círculo mais elevado da sociedade liberal com intuitos reformadores» não deriva apenas «de questões de método ou de novidades didáticas», assinala o investigador.

«A escolha de uma dedicação aos outros» foi «alimentada por uma fortíssima devoção eucarística»: «A prática da comunhão frequente, pouco comum à época, significava uma disciplina interior cuja vivência respeitava o procedimento assumido na sua vida pessoal e na relação de envolvimento com os que estavam à sua volta», explica Matos Ferreira no prefácio.

A ação de Teresa de Saldanha, salienta, «não pretendia a revolução societária enquanto mudança política, mas assentava em algo que dizia respeito à questão da consciência e às decorrentes práticas, no sentido objetivo da utilidade: educar para mudar, mudar para socorrer os aflitos e os necessitados, com particular atenção ao feminino».

 

Fontes: Revista "Vida Consagrada" (dezembro 2014); Congregação das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena, Convento dos Cardaes, Editorial Cáritas
Edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 07.01.2015

 

 

 
Imagem Teresa de Saldanha | D.R.
Em Lisboa nada existia, nesse tempo, de comunidades religiosas dedica das à vida ativa; nem Hospitaleiras, nem Doroteias; as Irmãs de Caridade francesas tinham sido expulsas; portanto, a falta tão grande de uma congregação que se dedicasse ao serviço dos pobres e educação de crianças fez-me desejar imenso trabalhar para realizar o meu sonho
Em 1859, fundou, em Lisboa, com algumas amigas, e dirigiu durante toda a sua vida a Associação Protetora das Meninas Pobres, com estatutos aprovados pela Santa Sé, a 21 de Abril de 1863. Esta associação está na origem da fundação da Congregação das Dominicanas de Santa Catarina de Sena, fundada em 1868
A ação da congregação que fundou, presente hoje em Portugal, Brasil, Angola e Moçambique, incide na educação feminina e de crianças, serviço aos pobres, assistência e ensino a deficientes e invisuais, auxílio a doentes e idosos e promoção social da infância e juventude, bem como na evangelização
«A escolha de uma dedicação aos outros» foi «alimentada por uma fortíssima devoção eucarística»: «A prática da comunhão frequente, pouco comum à época, significava uma disciplina interior cuja vivência respeitava o procedimento assumido na sua vida pessoal e na relação de envolvimento com os que estavam à sua volta»
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