Igreja e Cultura
Sem «inventividade» não há cultura mas apenas património adquirido
O que é mais importante (criar, manter, repensar) na relação da Igreja com a Cultura?
O mais importante na relação da cultura com a Igreja é que ela seja fiel à sua missão - o anúncio da Boa Nova - e assegure a seriedade do processo cultural.
Ambas as realidades, eclesial e cultural, convergem numa dupla dinâmica de procura da verdade e da liberdade. A investigação do que é verdadeiro e de uma efetiva liberdade é a operação essencial da cultura. A Igreja tem de cooperar com este trabalho comum, reconhecendo que a verdade não está sempre dada à comunidade humana mas é um esforço de permanente conquista e invenção.
A verdade e a liberdade são tão importantes para a Igreja como para a cultura e implicam-se uma à outra. Não é possível uma existência segundo a liberdade que não tenha como grande preocupação a busca da verdade, como também nunca será verdadeira uma aquisição da verdade que não leve em si a componente da produtividade.
Em termos mais concretos, a relação da Igreja com a cultura tem de processar-se segundo uma dupla polarização: o pólo da invenção permanente do novo, que no evangelho está configurado na expressão de ir buscar ao tesouro coisas novas e velhas, e simultaneamente reconhecer que essa criação precisa de um espaço institucional. A cultura é uma permanente busca da realização do humano que tem como suporte uma certa estabilidade, dada pelas instituições.
Compete à Igreja a atenção, o cuidado e a recetividade desse plano institucional, sem nunca sacrificar esse enquadramento à necessária criação. Se não for essa inventividade e esse constante aflorar de uma liberdade produtiva, não temos cultura mas apenas património adquirido.
É a fidelidade da Igreja à sua missão que lhe exige uma sensibilidade e um cuidar da cultura, pois só aí ela encontrará a possibilidade de mediar o mistério que traz em si.
Este depoimento, recolhido por telefone, integra a edição de novembro de 2011 do "Observatório da Cultura" (n.º 16). Leia mais respostas à pergunta.
Manuel Carmo Ferreira
Professor da Universidade de Lisboa
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16.11.11
Capela Árvore da Vida
Foto: Nelson Garrido