O vocalista da banda de rock irlandesa U2, Bono, que atua em Lisboa a 16 e 17 de setembro, está convicto de que «a pessoa que melhor escreveu sobre o amor na era cristã foi Paulo de Tarso, que se tornou São Paulo».
«Era um gajo duro. Superintelectual mas intenso e, claro, teve a experiência [de conversão] na estrada de Damasco. Passa a viver como fabricante de tendas. Começa a pregar e escreve uma ode ao amor, que toda a gente conhece como a Carta aos Coríntios: “O amor é paciente, o amor é gentil… O amor suporta tudo, acredita em tudo”», afirma.
Em entrevista ao diretor e fundador da revista “Rolling Stone”, publicada este sábado na revista do jornal “Expresso”, o compositor de 58 anos interroga: «Como se escrevem estas coisas quando se está no fundo?».
«Olho para alguém como Paulo, que está na prisão e escreve aquelas cartas de amor, e penso: “Como é que isto acontece? É espantoso”. Não o cura de tudo, do que ele pensa das mulheres ou dos “gays” ou do que quer que seja, mas no seu contexto ele tem uma visão do amor espantosamente transcendente. E eu acredito que é na escuridão que aprendemos a ver – quando não há luz», assinala.
Declarando-se «abençoado», sublinha que «a graça e algumas pessoas realmente inteligentes» ajudaram-no: «A minha fé é forte. Lia os salmos de David continuamente. São espantosos. Ele é o primeiro “bluesman”, gritando a Deus: “Por que é que isto me aconteceu?”. Mas também há honestidade nisso».
Sobre a sua intervenção em causas, Bono diz que hoje é «menos inseguro a assumir riscos políticos ou sociais»: «Quando me tornei ativista, as pessoas diziam: “A sério?”. Mas acabaram por aceitar».
«Depois comecei a interessar-me pelo comércio e pelos mecanismos que tiravam as pessoas da pobreza e as conduziam à prosperidade. E algumas pessoas disseram: “Não podes ir realmente por aí, pois não?”. E eu disse: “Mas quem é artista tem mesmo de ir por aí”», explica.
A entrevista termina com Bono a vincar o seu programa pessoal e artístico: «Quero ser lúdico. Quero ser experimental. Daqui em diante quero manter essa experiência de escrever canções que abandonei durante algum tempo. Quero ser útil. Isto é a nossa oração de família, como sabe».
E conclui: «Não é a oração mais grandiosa. Só diz que estamos disponíveis para trabalhar. É a oração dos U2. Queremos ser úteis mas queremos mudar o mundo. E ao mesmo tempo queremos divertir-nos. O que é que isso tem de mal?».
«Quando, no domingo e na segunda-feira à noite, dias 16 e 17 de setembro, os U2 subirem ao palco do antigo pavilhão da Utopia, em Lisboa, dificilmente alguma das pessoas ali presentes dirá que vai ver o concerto de uma banda cristã, que não o é, ou que quer ouvir mensagens cristãs, que as há», escreve Miguel Marujo.
Em texto publicado no blogue “Religionline”, o jornalista recorda palavras de Bono: «Eu só vou onde há vida, sabe? Onde sinto o Espírito Santo. Se é na parte de trás de uma catedral católica romana, na quietude e no incenso, que sugerem o mistério de Deus, da presença de Deus, ou nas luzes cintilantes de uma tenda revivalista, eu apenas vou onde encontro a vida. Não olho para a denominação».
É o seu «sentido de justiça que fez Bono decidir desfraldar uma bandeira da União Europeia no final dos concertos» e «a defender uma Europa que deve ser sentida, pelas suas “múltiplas afinidades” e “identidades estratificadas”», observa Miguel Marujo.
No início desta digressão pelo Velho Continente, Bono frisou: «A palavra patriotismo foi-nos roubada pelos nacionalistas e radicais que exigem a uniformidade. Mas os verdadeiros patriotas procuram a união acima da homogeneidade. Reafirmar isso é, para mim, o verdadeiro projeto europeu».