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Leitura: "A Senhora de Maio - Todas as perguntas sobre Fátima"

Leitura: "A Senhora de Maio - Todas as perguntas sobre Fátima"

Imagem Capa | D.R.

Uma «publicação mansa», mas não «um livro pacífico»: é nestes termos que a escritora Lídia Jorge qualifica o novo livro "A Senhora de Maio - Todas as perguntas sobre Fátima", dos jornalistas António Marujo e Rui Paulo da Cruz.

«Um livro como este cumpre o que há muito tem vindo a faltar: a tentativa de serenar ânimos tão diversos que vão desde o negacionismo escarninho de uns até ao fanatismo arcaico de outros, passando pelo vasto número daqueles que, do ponto de vista espiritual e teológico, gostariam de ver reaberta a questão», refere no prefácio do volume editado em fevereiro pela Temas e Debates.

Lídia Jorge defende que os autores «não pretendem infringir os limiares das convicções religiosas de quem quer que seja ao colocarem todas as perguntas sobre Fátima, antes através delas parecem sugerir que se deve abrir um dossiê fechado» até hoje.

«Os caminhos que vão dar a Fátima só se aprofundarão, e alargarão num futuro próximo, se sobre o que aconteceu, na Cova da Iria entre maio e outubro de 1917, os verdadeiramente interessados aí regressarem limpos de preconceitos, e abertos ao amplo entendimento entre humanos. É para a batalha da inteligência, suas potencialidades e limites, quando está em causa o indizível, que aponta este livro», conclui.

A obra, que inclui mais de uma centena de imagens, abre com testemunhos dos contemporâneos das aparições, Maria do Rosário e João Marto, seguindo-se o padre Luciano Cristino e António Matos Ferreira a preencher o capítulo "Fátima no contexto dos conflitos entre República e católicos».



«Parece-nos que é missão do santuário falarmos não só aos que já cá vêm habitualmente, mas também, com outras linguagens, aos que habitualmente não vêm. Se vierem pela via da arte, da música, para nós o que importa é que venham e que nos deem a oportunidade de falar com essas linguagens. Não nos parece que isso, de algum modo, possa desvirtuar o que é o específico do santuário»



O bispo Januário Torgal Ferreira, frei Bento Domingues e os padres Mário de Oliveira, Salvador Cabral e Luciano Guerra comparecem no espaço dedicado à "Pluralidade de leituras na Igreja católica", antecedendo "As leituras da antropologia e da sociologia religiosa", com Maria Belo e Moisés Espírito Santo.

"O fenómeno das aparições" é analisado pelos padres Peter Knauer, Antonio Nitrola, Mihály Szentmártoni e Stefano De Fiores, que antecede o capítulo sobre "A beatificação dos Pastorinhos", com Maria Emília Santos, a miraculada, padres Paolo Molinari e Luís Kondor, e cardeal José Saraiva Martins.

Sobre "A atualidade de Fátima, 100 anos depois" pronunciam-se o padre Carlos Manuel Cabecinhas, Alfredo Teixeira, o bispo Carlos Azevedo e Robert Schad.

Nos anexos, que ocupam cerca de uma centena de páginas, apresentam-se transcrições de interrogatórios aos videntes, evoca-se o atentado contra a capelinha das Aparições, apresentam-se mensagens dos papas, desde 13 de maio de 1946 (Pio XII) a 13 de maio de 2010 (Bento XVI), um espaço reservado à revelação da terceira parte do «segredo», entre outros temas.

O objetivo dos autores é ajudar os leitores, «com uma proposta de reflexão, a compreender melhor um fenómeno que galvanizou milhões de portugueses, ao longo de várias gerações e durante um século».



«Parece-nos que á nossa missão não nos prendermos aos que já vêm mas, utilizando a expressão do papa Francisco, sermos imagem de Igreja em saída, isto é, procurarmos ir ao encontro daqueles que habitualmente não vêm porque não têm interesse, procurando dar-lhes motivos de interesse por Fátima»



A maior parte do volume é composta por entrevistas realizadas em 1999 e 2000, a que se acrescentam quatro depoimentos recolhidos em 2008 e 2016.

«Como nota o bispo Carlos Azevedo, que foi o principal responsável pela publicação da "Documentação crítica de Fátima", "se repararmos nas descrições do fenómeno espiritual, nota-se a diversidade dos pastorinhos e das pessoas que assistem acerca do que conseguem ver e ouvir". E se isso "prova que não são criações encenadas, antes dependentes da capacidade espiritual, de quem é testemunha de um fenómeno místico", também revela que, "se fosse uma presença física e não uma visão, todos os presentes teriam idêntica perspetiva"», salientam os autores na nota introdutória.

«Também frei Bento Domingues chama a atenção para o facto de cada peregrino ir a Fátima "com a sua devoção, com as suas preocupações", construindo "a sua Fátima interior, o seu itinerário feito de dificuldades, de promessas e de reconhecimento"», continuam António Marujo e Rui Paulo da Cruz.

Por seu lado, «o antropólogo Alfredo Teixeira sublinha: "Fátima é um fenómeno de uma grande plasticidade; não há uma única Fátima, há muitas". E acrescenta: "Há uma nova narrativa religiosa muito presente nos fenómenos cristãos que apresentam mais vitalidade: a conversão é dirigida ao indivíduo, que é o interlocutor essencial. É o indivíduo que é chamado a converter-se"».



«A revista "Fátima XXI" ou as obras musicais encomendadas a compositores contemporâneos, quer portugueses quer de fora do país, não são produtos massificáveis. A capacidade de inscrever novas iniciativas não apenas na lógica da massificação, mas numa lógica da durabilidade, dará ao santuário outra projeção. Trata-se de obras com um estatuto cultural diferente, não de consumo rápido, orientadas para uma permanência».



«Esta individualização de Fátima adquire maior expressão se pensarmos que, pelos dados disponíveis, nove em cada dez portugueses já terão ido a Fátima pelo menos uma vez, mais de metade dos quais lá vai pelo menos uma vez por ano. Quase um terço fê-lo em peregrinação. Segundo outro número, quatro em cada dez fazem-no por necessidade espiritual», destacam os autores.

E em termos culturais e artísticos? O padre Carlos Cabecinhas, reitor do santuário, fala sobre o programa de centena e meia de atividades composto por concertos, exposições, debates e publicações.

«São nosso alvo, antes de mais, os peregrinos, aqueles que nos visitam. Mas sem dúvida que, com este conjunto de propostas, pretendemos atingir também outros. Sempre dirigimos as nossas atividades e iniciativas ao peregrino de Fátima e por isso são de entrada livre. Convidamos todos os peregrinos a participar. Temos consciência de que parte das atividades programadas não são tão procuradas pelo peregrino mais comum, mas podem atrair eventualmente outros públicos. E parece-nos que é missão do santuário falarmos não só aos que já cá vêm habitualmente, mas também, com outras linguagens, aos que habitualmente não vêm. Se vierem pela via da arte, da música, para nós o que importa é que venham e que nos deem a oportunidade de falar com essas linguagens. Não nos parece que isso, de algum modo, possa desvirtuar o que é o específico do santuário. Parece-nos que á nossa missão não nos prendermos aos que já vêm mas, utilizando a expressão do papa Francisco, sermos imagem de Igreja em saída, isto é, procurarmos ir ao encontro daqueles que habitualmente não vêm porque não têm interesse, procurando dar-lhes motivos de interesse por Fátima», explica o responsável.



«Algum do distanciamento mais crítico passava pelo preconceito de que Fátima estava mais ligada ao universo do irracional e às vivências sociais marcadas pela pobreza e pela menor escolarização de alguns setores da população portuguesa. Ora isso nem sequer se verificava sociograficamente, porque Fátima foi sempre (desde que temos estudos com capacidade de o mostrar) um fenómeno interclassista»



Alfredo Teixeira acentua que «a revista "Fátima XXI" ou as obras musicais encomendadas a compositores contemporâneos, quer portugueses quer de fora do país, não são produtos massificáveis. A capacidade de inscrever novas iniciativas não apenas na lógica da massificação, mas numa lógica da durabilidade, dará ao santuário outra projeção. Trata-se de obras com um estatuto cultural diferente, não de consumo rápido, orientadas para uma permanência».

«É necessário ler aqui uma estratégia clara do santuário, porque algum do distanciamento mais crítico passava pelo preconceito de que Fátima estava mais ligada ao universo do irracional e às vivências sociais marcadas pela pobreza e pela menor escolarização de alguns setores da população portuguesa. Ora isso nem sequer se verificava sociograficamente, porque Fátima foi sempre (desde que temos estudos com capacidade de o mostrar) um fenómeno interclassista. Entre essa realidade e as representações que, em particular nos meios intelectuais, foram sendo construídas, há um distanciamento que algumas destas iniciativas visam reduzir», comenta o professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica.



 

SNPC
Publicado em 02.03.2017

 

Título: A Senhora de Maio - Todas as perguntas sobre Fátima
Autores: António Marujo, Rui Paulo da Cruz
Editora: Temas e Debates
Páginas: 400
Preço: 17,70 €
ISBN: 978 989 644 4280

 

 
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